terça-feira, 15 de dezembro de 2009

PERSONALIZANDO A VIDA!


Peço perdão. Sinceramente. Perdão, caro leitor por começar essa crônica, de certa forma... Falando mal de alguém. Falo de “X”, pessoa de minhas relações. Falo tranqüila, por que sei que ela provavelmente não lerá essa historiazinha. Afinal, ela nunca tem tempo para nada. Para ler essa crônica teria de contratar uma personal-leitora, que faria o serviço enquanto ela está na esteira. Ocorre que, visitou-me e após se retirar fiquei pensando sobre o quanto sua vida era sem sentido e desprovida de valor intrínseco. Pronto, falei! Cheguei a essa conclusão, após ela me contar sua rotina e de como é cheia de “personais”. E não falo de professores de educação física, isso é absolutamente ultrapassado, apesar de que, ela têm. Ela me relatara sobre os diferentes tipos de personal que precisara contratar para se encaixar no padrão que a sociedade estabelecera de uma mulher bem-sucedida.
Ufa! Só de escrever já fico cansada! Vocês já deduziram que ela é rica, ou pelo menos classe média alta... Esses luxos não se aplicam a nós, pobres mortais. A conversa iniciou-se com ela relatando-me que contratara uma “personal stylist." Contou-me que não tinha tempo de escolher as roupas que usaria no dia-a-dia e assim essa profissional, ia até sua casa, quebrava a cabeça montando os diversos trajes que ela usaria no mês e deixava tudo etiquetado e arrumado, com acessórios separados só para ela enfiar pela cabeça. Ainda por cima, comprava os itens que fossem necessários e adequava as suas medidas. Um sonho, né? Só que a “Personal stilyst” indicara uma “personal home”. Essa profissional, gabaritadíssima, pois, pelo seu relato, deduzi que era formada em curso superior, organizaria todos os armários de sua casa. Deixando tudo rotulado, separado e visível. Ou seja, acabaria com a bagunça do lar. Maravilhoso, não?
E por aí prosseguiu o seu relato. Contou-me que o filho ia muito mal à escola. Notas ruins, comportamento péssimo. Assim, contratara um “personal teacher” que ia até sua residência fazer as tarefas com o garoto e uma psicóloga. Que eu, com um toque de cinismo- não pude deixar de pensar, seria uma “personal mother”- para conversar com o garoto e descobrir o quê eu já deduzira: Ele estava carente de mãe. Presença física mesmo. Eu sei. Eu sei... Que estou sendo dura. Afinal, “x” trabalha muito e é uma referência no seu campo de atuação. Mas, comecei a achar que o preço disso tudo estava saindo muito caro...
Toquei no assunto e ela me falou que realmente, vinha gastando horrores, pois, na última semana tivera de contratar uma “personal Shopper”, para comprar os mantimentos no supermercado, produtos de limpeza e tudo o mais que fosse necessário para o bom andamento da casa. Afinal sua empregada (que não deixava de ser personal-maid) não podia fazer essas tarefas. E, para arrematar, contratara uma “personal dog”. Aí, eu assustei! Exclamei, “personal o quê?” e ela falou pausadamente: Dog. Essa profissional passa todos os dias em sua casa e leva os cachorros para passear. Além de uma vez por semana levar ao pet shop.
Despediu-se apressada, precisava remarcar o horário com sua “personal massagist” , que todos os dias passava em sua casa, levando uma maca portátil, para lhe aplicar uma massagem relaxante. Realmente. Era muita tensão! Senti-me uma roceira, mesmo! Quer dizer que para ter aquela aparência perfeita, carreira, marido, filhos exemplares, casa impecável, cachorros de revista, era necessário tudo isso? Será... Vamos raciocinar juntos, que não seria melhor ela simplesmente ficar um período no lar e ser um pouco mãe, dona-de-casa, etc. Relaxar cuidando de tudo o que lutara para construir. Quase sugeri isso, ainda bem que me contive! Com certeza ela me olharia horrorizada e me indicaria seu “personal analyst”. Esse último para fazer com que eu me enxergasse e enxergasse melhor o mundo em que eu vivo.

ELIANE BRITO, é escritora e advogada. eliane@rodovalho.com.br.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

AVATAR


A primeira vez que ouvi a palavra “avatar” foi na Índia. Intrigada com todas as manifestações do Deus Vishnu, que em cada localidade assumia uma personalidade e um nome diferente, busquei informações e descobri que eram diversos avatares. Para o hinduísmo, o avatar é a manifestação corporal de um ser imortal. Essa designação deriva da palavra sânscrita “avatara”, que significa “descendente”. Em uma tradução abrasileirada seria a encarnação de um Deus em forma humana ou animal. O que ocorre com Vishnu é que ele se encarna parcialmente em todos os seus avatares. Porém, tem uma peculariedade, este jamais participa do sofrimento humano, sob pena de perder seus poderes extraordinários. Para o cristianismo seria o equivalente a manifestação do espírito na matéria, gerando o nascimento. É incrível como a realidade virtual está sempre resgatando esses conceitos que transitam perdidos pela psique humana. Para o mundo moderno é o desenho ou a representação gráfica de uma imagem. De pessoa ou não, em um Chat de terceira dimensão ou no ciberespaço.
Criar seu próprio avatar é uma tendência e cada vez mais pessoas aderem à essa brincadeira. Várias redes sociais já disponibilizam esse aplicativo e os internautas se divertem com as estripulias de seus “seres imortais”. Não tenho dúvidas, se eu tivesse de escolher um avatar seria aquele que eu incorporava na minha infância: a mulher-maravilha. Até hoje me recordo do nome da atriz que interpretava o personagem, Linda Carter, e de seu semblante perfeito. Morena, de olhos azuis, vestida com aquela roupa recortada da bandeira americana (agora eu sei....) azul e vermelha, cheia de estrelas prateadas. Em minha imaginação de criança era o meu ideal de mulher perfeita. Justiceira. Certo aniversário ganhei de presente a fantasia da famosa heroína. Foi o melhor presente que já recebi na vida! Brinquei tanto, corri, saltei, lutei contra vários seres do mal, que só desisti da roupa, depois de muito choro, quando mamãe deu um sumiço nos farrapos que sobraram. De herança, fiquei com um saldo de um dente quebrado, após saltar de um muro de aproximadamente dois metros. Mas, o que importava isso? Eu era uma heroína! Eu salvava o mundo. Seria esse o objetivo de um avatar? Encarnar nossos mais altos ideais?
A internet é um mundo paralelo. As pessoas apenas reconstroem conceitos. Trabalham com antigos paradigmas e recriam sua realidade. Fica a imprensão de que tudo é novo, mas, na verdade é tudo um jeito diferente de contar velhas histórias. É uma divertida brincadeira que esconde uma face triste. As pessoas buscam a interação, um mundo mais seguro, valores antigos como amizade, romantismo e alguns princípios que já não estão mais em voga. Como não encontram no mundo real, viajam para seus mundos paralelos. Nesse mundo de avatares, não existe principalmente a morte (esse ser é imortal), não existe tristeza, fome ou fealdade. O mundo pode ser o mais belo que a imaginação conseguir criar. Nessa sociedade hedonista, abrimos mão de tudo que não seja absolutamente prazeroso e nos refugiamos no mundo maravilhoso do ciberespaço.
O chato é que a brincadeira uma hora acaba. Aí precisamos encarar nosso mundinho, finito, monótono e cheio de tragédias. Bom, se você quer um conselho, faça como eu: _Traga sempre seu avatar (aquele justiceiro, cheio de caráter, fé e amor), dentro dos bolsos de sua imaginação. E, sempre que a realidade permitir, deixe que ele se manifeste! É assim que lhe damos vida! Deixe que ele salve o mundo, as crianças carentes, as velhinhas, etc... Mas, que essa brincadeirinha fique somente entre nós... é segredo.

ELIANE BRITO é escritora, advogada, sócia da ONG “Fazemos o bem”. eliane@rodovalho.com.br

Germinando o milagre da vida!

Comprei uma revista que falava sobre os poderes maravilhosos dos sucos. Trazia uma receita especial sobre o “suco de grãos germinados”. Recomendava que, de preferência se pusesse para germinar a semente de trigo. Esse cereal, segundo a reportagem, reforçava nossas atitudes de persistência e coragem. Comprei a semente e fiz como ensinavam: coloquei de molho por oito horas, escorri, depois coloquei para crescer sobre uma vasilha de barro, repousando sobre um tecido de algodão cru. Reguei duas vezes por dia somente com água e aguardei.
Como foi mágico quando a semente germinou. As folhinhas, parecendo pequenas lâminas, extremamente verdes, começaram a aparecer em meio aos grãos e dia após dia se transformaram em minha lavourazinha particular. Lembrei dos trabalhos escolares, quando colocava o grãozinho de feijão para crescer em cima do algodão... Agora, sentia a mesma emoção novamente, observando meu pequeno milagre. Quando trazemos a natureza pra dentro de casa, mesmo com esses pequenos gestos, todos se envolvem. Minhas filhas acompanhavam o processo e me davam um relatório assim que eu entrava em casa. Tive até de chamar a atenção! Molhavam demais as frágeis plantinhas, correndo o risco de matá-las, por excesso de água.
Finalmente chegou o grande dia. Quando supus que já estavam de bom tamanho, anunciei: _ Vou colher um pouco dos grãos germinados para fazer o suco! Todas correram para a cozinha atentas ao processo. Tentei puxar as sementes e que surpresa! Estavam grudadas de forma firme no tecido. As raízes, tais quais pequenas ramas, se infiltravam pelas fibras, tendo o triplo ou mais de tamanho em relação às folhas. E eram resistentes. Puxei com força, mas não desgrudaram. Ficamos atônitas e maravilhadas (gente da cidade é boba mesmo!). Questionamo-nos se colocaríamos as raízes no suco e eu decidi rápido: _É claro. Têm muitas proteínas e nutrientes! Cortei uma porção cuidadosamente com a faca, lavei, coloquei no processador com maça, cenoura, limão, laranja, couve (rica em ferro) e alface (calmante e desestressante). Adocei com mel e coei. Parece ruim? _Ficou uma delícia! Por incrível que pareça, as meninas (que acompanharam o plantio) foram as primeiras a tomarem.
Descobri que esse suco é mágico mesmo! Não pelo suco em si, que alguns dizem que cura toda sorte de doenças. Mas, pelo processo do plantio, do cuidado, da preparação. Aprendi a observar o tempo das coisas. Aguardar que a natureza aja e esperar que as sementes brotem. Aprendi sobre o cuidado, sobre amor, regar com a quantidade certa todos os dias, aguardando com paciência que surjam os primeiros raminhos. Aprendi sobre raízes. Como elas se entranham e são resistentes. Muitas vezes observamos apenas a superfície das coisas sem olhar seu substrato. Aquilo que as sustenta. Aprendi um pouco mais sobre o trabalho paciente. As pequenas ações que parecem que não vão dar em nada, mas que, com um pouco de calma, transformam-se no milagre da vida. E de quebra, aprendi que as misturas mais inusitadas podem render bons sucos. Que é da diversidade que nasce os sabores mais incríveis. Saúde!

ELIANE BRITO é escritora, advogada, conselheira eleita da OAB-GO. eliane@rodovalho.com.br

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

LIBERDADE DE EXPRESSÃO


Na vida estamos sempre cercados pelo medo. É o medo da violência que cresce assustadoramente; É o medo da economia que parece que vai ter uma nova derrocada; É o medo dos radicais livres, terror de todas as mulheres; É o medo da gripe, de um acidente, qualquer fato aleatório que possa nos retirar da nossa tão amada e querida rotina. Para nós, intelectuais, o maior medo possível é o de dizer o óbvio... Tenho pavor de sentar aqui nesse computador e escrever exatamente o que lhe agrada, caro leitor.
Pode parecer pretensão minha, mas eu sei como atingir o seu coração. É só escrever textos “politicamente corretos”, sem usar um palavrãozinho, sem tocar em nenhuma minoria e tudo fica perfeito. Respeitar os assuntos tabus, e são tantos... Religião, política, sexo, autoridades, homossexualismo, etc. O problema é um só. Ficamos sem assunto, não é mesmo? Você aí do outro lado, quer pensar, quer provar novos conceitos, idéias, concepções que de alguma forma possam transformar a sua vida.
A nossa Carta Magna garantiu a ampla e irrestrita “liberdade de expressão.” Assim, por maldição ou escolha própria, não sei, decidi relatar a vidinha bem pacata e classe média dos meus concidadãos. Talvez a vida real, aquela que realmente valha a pena. Falo da dona-de-casa, da mãe, da executiva, dos trabalhadores, do homem médio, como diria o filósofo, do cidadão comum... Todos os dias bato papo com o porteiro do prédio, com a empregada que chega com o pão, com a vizinha, com as pessoas na rua. É impressionante como podem ser ricos esses diálogos. Como eles retratam e materializam nosso momento atual. O mundo em que vivemos.
E como é bom ser testemunha de seus medos e terrores. É o medo da carestia, medo da crise econômica, medo do fim do mundo. Medo de ir para o inferno (têm gente que ainda têm). E as expressões impagáveis que eles usam? Quem vai colocar nos jornais? Expressões como uma bastante utilizada por minha secretária: _Pelo sangue do cordeiro! E suas justificativas? Esses dias, após soltar essa pérola, bateu na boca e pediu perdão à Deus na mesma hora. Perguntei o motivo e ela me relatou que todas às vezes que soltava esse “caco” os anjos no céu caiam de joelhos no chão, com o rosto por terra.
Só a força da criatividade mesmo pra nos livrar da mediocridade sem fim do óbvio. É por isso que, quando digo que o meu maior medo é o de me render ao lugar comum de falar o esperado, entenda-me: Mesmo quando eu atingir algo que lhe é caro, não se assuste. Isso é uma celebração a diferença. Ao inexato. A revolução, que deve acontecer em nossas vidas todos os dias. São essas transformações que trouxeram (nós humanidade) até aqui.
Pode não ser um mundo ideal e não é. Pode não ser um mundo cor-de-rosa e não é. Mas é um mundo onde se briga pela liberdade. De cada um dizer o que quer, da forma que melhor lhe convém, sem censuras. Essa, a maior vitória do século XXI. E mais, de cada um, viver dentro do que acredita e com alguém observando e contando essa incrível história (nós escritores). Bem disse Voltaire: “Posso não concordar com nada do que você diz, mas daria minha vida para que você possa dizê-lo”.

ELIANE BRITO, é cronista, escritora e advogada. "Recusando-se a aceitar censuras!" eliane@rodovalho.com.br

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Sobre ser forte, ter atitude e renovar!




Vamos admitir: O mundo está um tédio! Cansativo... E isso não é por falta de ideias para defender ou lugares para ir. É exatamente pelo contrário. Excesso de informação, de conceitos, de atividades. Começamos a sentir a escassez de algo bastante simples, como o tempo, por exemplo... Veio-me agora na cabeça a lembrança do coelhinho da Alice (aquela do País das Maravilhas), correndo de um lado para o outro, consultando seu relógio maluco e gritando que estava atrasado. Estamos sempre atrasados. Para tudo. Para acompanhar a gama de informações que circula na internet, teríamos que ficar conectados o tempo todo, acompanhar os fatos políticos, catástrofes etc. É um universo imenso que simplesmente não conseguimos absorver.
Vivemos a ânsia pelo novo, e isso pode ser perigoso. Explico. Perigoso porque na nossa sede de “estar por dentro” podemos cometer enganos, ter atitudes incoerentes, como, exemplificando (por comodismo mesmo), defender a bandeira da renovação em tudo. Essa atitude é bastante cômoda, porém traiçoeira, pois a mudança é importante e necessária, porém não podemos deixar de ter certeza de que realmente estamos mudando para melhor. Vivemos a era do marketing. A mídia pinta os quadros da mudança de uma forma tão bela que fica difícil não comprar as ideias que nos vendem. Tudo novo nos parece perfeito. É a era do consumo rápido em todas as coisas, relacionamentos, posições políticas, bens materiais etc. A expressão da hora é “zona de conforto”. Todos em bloco lutando para se libertar dessa famosa zona. Quem opta pela estabilidade, solidez de princípios pode incorrer na alcunha de retrógrado, ultrapassado. É nessas horas que gosto de ostentar meu título de rebelde! Enquanto todos lutam pela mudança para qualquer coisa ou qualquer lugar, caminho na direção contrária, busco a densidade e a solidez das grandes obras, dos grandes ideais, de quem trabalha direito e faz as coisas acontecerem de forma verdadeira e eficaz. Fazer o quê, se a rebeldia e a inteligência são traços marcantes do meu caráter.
É tudo uma questão de autoestima. Quem tem personalidade sabe que a atitude correta a tomar passa sempre por ter opinião. Por defender aquilo em que se acredita. Atitude é trabalhar com seriedade. Atitude é ter personalidade, dar a cara à tapa na certeza de que está fazendo a coisa certa. Renovar sim, com segurança, com fortaleza, sabendo que nunca devemos desprezar quem trabalha com amor e fé em prol dos semelhantes. Atitude é conservar o status quo. Renovar é manter tudo refrescado e novo exatamente como está, porque essa é a melhor saída. Coragem é entender que aventuras são muito interessantes em filmes e em livros, mas na vida da gente... Como é bem-vindo um pouco de paz e serenidade.Precisamos aprender com os orientais, que fazem isso muito bem, muitas vezes devemos nos abster de agir e nos manter firmes e conectados com nossas instituições e valores estabelecidos. E se a mudança ocorrer, que seja dentro das estruturas que já estão em pleno funcionamento. A rainha, no livro de Alice, disse a seguinte frase: “É necessário correr o máximo possível para ficar no mesmo lugar. Se você quer chegar a algum outro lugar, deve correr pelo menos duas vezes mais rápido do que isso”. Isso é atitude, isso é renovação, mas isso, acima de tudo, é ser FORTE!


Eliane Brito é escritora, cronista, advogada, membro da Chapa OAB-Forte (eliane@rodovalho.com.br)

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

A LOUCA DA CAMISOLA.


Todos os dias tudo se sucedia da mesma forma. Ela acordava por volta de seis da matina e preparava os dois filhos para irem à escola. A menina de aproximadamente três anos e o menino de cinco. Colocava os dois no banco de trás do carro, prendia o cinto no mais velho, sentava a menor na cadeirinha especial e dirigia apressada, como todas as mães na manhã. Até aí pareceria uma rotina normal... Pareceria... Porém, alguns fatos destoavam. Primeiramente, ela jamais conseguira ser aprovada no teste para retirar a carteira de motorista. Depois de inúmeras tentativas, simplesmente desistira da preciosa carta. E assim, dirigia o dia inteiro desautorizada. Outro fato realmente peculiar é que realizava esse ritual sempre de camisola. Isso mesmo! Do jeito que levantava da cama, jogava um penhoar desbotado por cima da roupa de dormir e iniciava o dia.
Esse fato já a tornara lendária no prédio onde morava. Os vizinhos que saiam no mesmo horário sempre a ajudavam a carregar toda a tralha, a meninada e a se estalarem no carro. Sempre que alguém comentava algum assunto relacionado a ela, para se confirmar à identidade, alguém mencionava: _Você está falando de quem? É a mulher da camisola? Pronto. A identificação estava feita.
Certo dia acordou da forma habitual, correria, rosto inchado, sacolas, chupetas, lancheiras, vizinhos segurando as crianças (enquanto ela penteava os cabelinhos no elevador), amarrava o penhoar, etc. Tudo normal. Mas, como diz a bandidagem: _ Um dia a casa cai! Dirigia calmamente, enquanto escutava as notícias no rádio, distraída, quando visualiza uma Blitz da polícia militar. O guarda faz sinal, arrogantemente, para que ela encoste o veículo. Ela abaixa o vidro e o policial, com cara de poucos amigos diz:
_Habilitação.
_Não tenho não, seu guarda. Quer dizer, está em casa...
Respondeu defensiva.
_Documentos do veículo.
Ela olha em volta e percebe que esquecera na correria a bolsa onde guardava o mesmo. Responde sucinta:
_Esqueci.
O guarda retruca:
_A senhora por gentileza queira descer do veículo.
Enquanto isso, a menina já começara a chorar em altos brados... Gritando a plenos pulmões. Mamãe!!! Mamãe!!!
Ela sem saída desce do veículo. O guarda perplexo fala:
_A senhora está de camisola!
Ela respondeu apenas:
_Pois é!
_Bem, sinto muito mais vou ter de apreender o veículo. Falou taxativamente enquanto começava a lavrar um termo no bloco de anotações.
Ela ainda argumentou, pediu, explicou que levava as crianças para a escola. Tudo em vão. O guarda impassível escrevia sem sequer olhar em seu rosto. Quando acabou de preencher o termo falou:
_A senhora, por gentileza assine aqui.
Ela nervosa assinou. Implorou novamente. Ele com cara de poucos amigos. Quando viu que não tinha mais jeito, entrou no carro, despediu-se dos filhos com um beijinho, desceu decidida e falou:
_Então, tá certo! Pela placa do veículo o senhor pega o meu endereço e entrega as crianças lá em casa, viu? Leve depois das cinco da tarde, porque agora eu vou trabalhar.
Falou isso enquanto virava as costas e começava a andar. O pobre policial ficou em estado de choque. Com a voz esganiçada, exclamou:
_Espere! A senhora vai embora e vai largar os seus filhos aqui?
Perguntou chocado.
Ela respondeu:
_É claro! Eu moro a uns dez quarteirões daqui. Estou sem bolsa, sem dinheiro e sem carro, de camisola e com duas crianças. O senhor acha que eu vou caminhar, uma distância dessas, carregando esses bebês? De jeito nenhum. O senhor os entregue lá em casa depois...
O policial começou a correr atrás dela desesperado, gritando:
_ Calma! A senhora não pode fazer isso...
Ela parou com as mãos na cintura e perguntou?
_O quê o senhor sugere?
Ele já contemporizando falou:
_Vamos fazer assim... a senhora me promete que não sai mais sem habilitação e eu vou lhe liberar o veículo. Ela ainda pensou uns segundos antes de concordar.
_O. K! O senhor encontrou uma ótima saída.
Cumprimentou-o.
O policial lhe devolveu as chaves, ela se despediu com um aceno rápido enquanto se afastava.
Por incrível que pareça nunca chegou uma multa em sua casa.

ELIANE BRITO é Cronista, Escritora e Advogada. eliane@rodovalho.com

ADVOGANDO COM PAIXÃO!


Os dados não são exatos, porém, demonstram que as mulheres advogadas superam em quantidade o número de homens. Na prática, poderia ser ainda mais expressiva a presença feminina na militância jurídica. Presença real, pois, muitas mulheres ostentam a carteirinha dessa entidade poderosa, como um troféu, um luxo que carregam na bolsa. Muitas se dedicam a outras atividades, enquanto mantém essa porta aberta, como uma possibilidade remota. Para o caso de resolverem advogar no futuro...
Por outro lado, vemos mulheres brilhantes, fazendo a opção pela estabilidade de um cargo público, em detrimento dos desafios e incertezas do dia-a-dia de uma advogada. Mesmo quando guerreiam na advocacia pública, sofrem as limitações inerentes à função. Sejamos honestos: Advogar não é fácil. Seja para qual sexo for. Porém, a situação da mulher no mercado de trabalho é agravada por diversas influências aleatórias, diferentes das experimentadas pelos homens. E, o nosso constituinte já sabia disso, quando erigiu à categoria de princípio constitucional a dignidade da pessoa humana. Em sua exposição de motivos, trabalhou com a máxima de que devemos tratar a todos com igualdade “e os desiguais na medida de suas desigualdades.”

Sejamos ainda mais honestos: As mulheres são diferentes; procriam, trazendo seres ao mundo que precisam ser amamentados, cuidados e formados; administram lares, escritórios e por aí vai... A lista de tarefas de uma mulher é imensa. Para coroar tudo, ainda são as estrelas principais do show, quando atuam no palco da justiça. Quantas e quantas vezes ficam ouvindo piadinhas machistas pelos corredores do fórum, fazendo um ar blasé, com a cabeça fervendo com tantas responsabilidades... Isso enquanto se equilibram em scapins altíssimos, envelopadas em saias justíssimas (tudo pelo decoro jurídico).
Se o mundo fosse justo -o que eu já descobri que não é- seria respeitada a resolução do órgão especial do Tribunal de Justiça de Goiás, garantindo o direito das advogadas de trabalharem com a mais democrática das roupas: Calça jeans! E um belo par de tênis nos pés! Isso sim é retidão. Mesmo que a regra exista, sabemos que na prática costumeira, é inviável... Para piorar, correm desengonçadamente pelos corredores da justiça, enquanto carregam computador de mão, celular e outras parafernálias, que ajudam a controlar filhos, marido, clientes, etc. Haja fôlego!
Ainda bem que contam com a OAB. A ordem tem atuado de forma implacável na defesa dos direitos e prerrogativas das advogadas. Através de ações concretas, tem garantido a dignidade e o respeito no exercício da profissão. Isso, de certa forma, tem contribuído para que mais mulheres optem pelo exercício da advocacia.
Apesar dos pesares confessemos: É emocionante advogar. Quando se adentra o escritório e a secretária eufórica balança uma decisão na sua frente e exclama; _ liminar! Ou, outro fato qualquer, esquece-se todos os contratempos. Sente-se o gosto doce da vitória. O prazer de realizar um trabalho digno e que gera frutos. A satisfação é o sentimento remanescente. É uma profissão instigante, que coloca o profissional em contato com pessoas de diferentes atividades, com atuação em múltiplos ramos da sociedade civil.
Para melhorar, ainda é uma profissão que não mantêm a advogada presa dentro de quatro paredes (pelo menos o tempo todo). Se ganha mobilidade, o que é estimulante mentalmente. Propicia um conhecimento profundo da alma humana, de suas mazelas e dores. Arrematando, é gostoso saber que se pode contar com uma entidade de classe forte e atuante. Que nos supre com a o respaldo, aliado a força necessária para trabalhar e ter sucesso! Se você é mulher e têm esse pequeno luxo (a carteirinha...) na sua bolsa, venha, advogue, faça sua vida bem mais apaixonante!

ELIANE BRITO é escritora, advogada, membro da Chapa OAB FORTE.
eliane@rodovalho. com.br. Artigo publicado no DM do dia 25/10/2009

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Em briga de marido e mulher, meta a colher!

Moro em um bairro nobre, uma região com milhares de prédios, colados uns aos outros. Nessa madrugada fiz algo que jamais havia feito: liguei para a polícia. Ocorre que, acordei assustada em plena madrugada, com os gritos agudos de uma mulher, apanhando. Os sons das pancadas eram claros com o choro desesperado das crianças ao fundo. Deduzi que fosse o marido, aos brados, gritando palavrões, enquanto espancava a pobre criatura. Fiquei ouvindo por alguns segundos, tentando identificar de onde vinha o som e percebi que era do prédio ao lado. Observei que as luzes do edifício estavam acesas. Deduzi que os vizinhos, assim como eu, acompanhavam a sessão de tortura. Porém, não ouvi vozes de terceiros interferindo ou prestando auxílio. Indignada, peguei o telefone e liguei para a polícia. Continuei ligando, de cinco em cinco minutos, até que ouvi os sons de sirene na rua e a calmaria voltou a reinar.
Penso que chegou a hora de metermos a colher no meio dessa briga. Os números da Delegacia de Homicídios são alarmantes e demonstram que dezenas de mulheres estão morrendo em decorrência da violência doméstica. Sinto-me de certa forma culpada, por nunca ter tomado nenhuma providência para minimizar essa situação. Ao menos, escrever um artigo, como agora. Talvez em decorrência desses conceitos arraigados de que não devemos nos intrometer no lar alheio. O que esses homens fazem é crime! E, precisa ser punido como tal. Nossa Constituição Federal foi bem clara ao afirmar que a casa é “asilo inviolável.” Porém esse conceito não é absoluto. Como quase tudo no direito. Podemos romper com essas amarras em caso de “flagrante delito ou mesmo para prestar socorro”. (Art. 5º, inc. XI, CF)
Sendo assim, não pense você que sou uma “vizinha intrometida”. Sou uma cidadã que gosta de fazer valer os seus direitos. E o dos outros, é claro. Depois do episódio encerrado, fiquei tomando uma xícara de leite quente (já que havia perdido o sono) e analisando os motivos de tantas agressões contra mulheres em nosso estado. Ocorreu-me a hipótese de que (o que para mim parece saltar aos olhos) esse comportamento é resultado da cultura machista do homem goiano. Nossa herança agrária. A mulher é vista como “res” ou na tradução latina, “coisa”. Um objeto que pode ser destruído, caso não atinja mais sua finalidade. É a “coisificação” do ser humano. Uma visão distorcida levando a essas barbaridades.
O homem que compactua com essa posição não aceita, por exemplo, o divórcio. E mesmo quando aceita, se considera proprietário da ex-esposa. Passando a demonizar a vida da ex-companheira, como legítimo dono. Um brinde com leite a nós mulheres! Como somos bem resolvidas... As estatísticas mostram que somos as primeiras a perceber que um relacionamento fracassou e cair fora! Sejamos honestos, o que mantém uma união é o afeto e principalmente o respeito, inclusive à integridade física do outro.
Que os homens apreendam a aceitar o fim de uma relação, tenham a dignidade e a hombridade de reestruturar suas vidas e PAREM com essa covardia de bater, matar e aterrorizar mulheres e crianças desprotegidas. Uma coisa eu te garanto. Se for na minha frente, eu chamo a polícia! Código Penal e Lei Maria da Penha neles...

ELIANE BRITO é Escritora, Cronista, Advogada. eliane@rodovalho.com
Crônica publicada no DM do dia 12 de outubro de 2009.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

FLORESÇA E PROSPERE


Como é bela essa palavra: florescer. Quando a falamos nossos olhos brilham, mentalmente visualizamos (pelo menos eu...) um botão de flor se abrindo... Um jardim multicor expandindo e dominando a paisagem, etc... Foquei minha atenção a esse verbo, em como ele é sonoro e forte, em como nos remete à ação (essa teoricamente a característica de todos os verbos). Comecei a estudar sobre isso na Cabalah. Pronuncia-se cabalá, com a última sílaba bem forte e um dos ensinamentos que aprendi foi que: Toda palavra tem poder. Toda palavra, cria essa alteração mental que nos remete a um local, um objeto, uma sensação, que podem criar a nossa realidade. É um ensinamento profundo, que precisa muito mais do que ser compreendido, ser sentido com todo o nosso corpo. Após minhas práticas de meditação, comecei a exclamar em voz alta, palavras diferentes, para ver o efeito que produziam. É inevitável, palavras andam acompanhadas de imagens, não tenho dúvidas. Entretanto, quando exclamei: Florescer! A imagem que me veio à mente foi a de uma pessoa feliz, correndo por um campo de margaridas amarelas...
Percebi que a natureza e os objetos inanimados, só ganham sentidos quando fazem as pessoas felizes. Quando nós seres humanos, podemos desfrutar de sua beleza. Quando nos trazem alegria. Como foi bela essa imagem mental que criei! Na verdade quem florescia eram as pessoas, não as flores. Quem florescia era aquele ser humano, que caminhava livre e de peito aberto pelo mundo. Comecei a perceber como tornamos difícil o nosso eclodir. Simplesmente por que muitas vezes nos sentimos ridículos, com todos os impedimentos e suposições negativas que criamos ou que permitimos que criem em nossas vidas. Vejo que é necessário fortalecer e reforçar nossas convicções em nossos ideais. Acreditar em nossos sonhos e fazer o melhor. Temos de ser o paciente jardineiro que caminhará por entre as alamedas de “nãos”, pelos labirintos de “impossível” e exclamará tal qual um mágico que carrega poderes ocultos. Floresça! Zás.
Outro ensinamento maravilhoso que extraí do estudo da Cabalah, foi que tudo que existe em nosso mundo é composto de somente uma matéria prima: Luz. Sem a luz nada existiria e as coisas só existem quando vêem a luz. O mito da caverna de Platão explica um pouco isso. Que o fato de nos mantermos no escuro, nos impede de tornar as coisas reais. Compreensíveis. A luz é tão importante... Usando um exemplo bem tosco: estou construindo uma casa e no mesmo dia em que meditei sobre a importância da luz, a arquiteta responsável pela obra, me disse a seguinte frase: _Não economize em luz! Invista! Luz é tudo e pode fazer sua casa muita mais bela. Aproveitando essas palavras poderosas e transportando para nossa vida, percebo a importância de sermos iluminados. De deixar que as luzes que nos cercam, venham do universo, venham de nossos semelhantes, nos iluminem e nos permitam florescer. Tomei então a seguinte resolução. Quando perceber que alguém está tentando destruir o meu jardim, apagar a minha luz ou coisa semelhante, direi SIM. Sim as minhas vocações, sim aos meus sonhos, sim as minhas vontades e correrei livre em meio ao meu campo de margaridas mental.
Os talentos e as aptidões que cada um ostenta são únicos e intransferíveis. Quando alguém tentar retirar, o que é meu, de minhas mãos, responderei: “São meus e só eu posso transportá-los. Carregue os seus dons, distribua os seus tesouros, compartilhe e deixe que eu faça o que preciso fazer.” Assim, quando os outros me virem prosperando, ignorarei seus rostos apáticos e vazios. Essas expressões são autênticas em quem não permite que o seu melhor aconteça e apareça para o mundo. Alguns acham que a vida é tenebrosa. Que nada é possível, que o planeta é um lugar áspero e sem luz. Que somos criaturas das trevas. Preste atenção. Se você compartilhar o seu melhor, sua vida se encherá de esperança e lhe trará a vitória em tudo que fizer. Assim, concluo para mim e para você: Floresça e Prospere!
ELIANE BRITO é Cronista, Escritora e Advogada. eliane@rodovalho.com.br
Publicado no DM de sábado, 19-09-09.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

BOA AMIGA...


Quando me afasto em meu carro dourado, quase posso ouvir o suspiro dúplice, de alívio e de tristeza que ela exala. Pilotando meus sapatos de bico fino, ostentando algumas pérolas e a indefectível bolsa vermelha, retirei-me, não sem antes deixar flanando pelos ares o aroma do perfume francês.
Minha loucura é tudo aquilo que me impele para longe. Quando cheguei para essa visita, pressenti que ela não queria minha presença ali, quando me retirei, podia sentir em seus lábios o pedido para que ficasse. Porém, não poderia me estender mais, minha missão estava completa. Conseguira retirá-la duma redoma de dor e trazê-la de volta à mediocridade do dia-a-dia, melhor dizendo, aos afazeres banais que compõem nossas vidas. Entregara uma mensagem louvando a existência e suas transformações. Louvando o fútil, que incorpora noventa por cento de nosso dia-a-dia. Com minha presença lhe lembrara de negócios, leis, política, trivialidades e um pouquinho de sexologia. Assunto que não pode faltar em nenhuma conversa que se preze. Assim, a catapultara de seu mundo de deveres e correção. Senti que ela se fortalecia com minha presença. Nossos antagonismos em estilos de vida a levavam a louvar cada vez mais suas escolhas, a dignidade de todos os seus caminhos.
Eu me desdobrava no papel de anti-heroína. Ação que desempenho a perfeição. Minhas atitudes fazendo o contrabalanço perfeito com sua simplicidade espartana. Seu mundo se restringia aos livros, aos grandes debates, aos filósofos e suas contradições. Os dedos manicurados voando pelos ares, em contraponto com suas mãos, desnudas e sem grandes cuidados. Tenho certeza de que minha figura a lembrara de todas as coisas das quais ela não necessita: jóias, perfumes, festas, massagens, maquiagens, viagens. Todo o universo que envolve a vida de uma mulher mimada e cheia de manias. A visita se desenvolvia e ela se sentia cada vez melhor.
Observava-me, sem saber que entre luz e sombras, também existem coisas bonitinhas que eu defendo com unhas e dentes, como dignidade, justiça, caráter, etc. Mas essas eu não queria lhe mostrar. Não lhe interessavam naquele momento. Pensando nessa nossa amizade improvável, porém, tão bonita debaixo dos raios do sol, fiquei ali lhe admirando... A impetuosidade versus a correção. O orgulho versus a humildade. Parecia estranho, mas se complementavam e tornavam esse mundo estranhamente perfeito. E às vezes esses sentimentos se transmutavam de lugar. Oscilavam entre mim e ela. Principalmente o orgulho. Esse o norte de suas ações e também das minhas. Afinal, todos defendem suas preferências. Isso é inerente ao ser humano. Minha boa amiga, tão bonita e ao mesmo tempo tão frágil em sua simplicidade.
Sentindo o peito apertado percebo que é hora de partir. Os sinais são claros. Seus olhos já estão brilhantes, sua fala rápida, suas idéias efervescentes. Já destruíra todas as suas defesas. O vulgar tem esse poder. À custa de muito esforço abrira algumas fissuras em sua armadura, afastando a depressão e permitindo que o sol entrasse em sua vida. Você, minha boa amiga, até cogita surpresa e espantada sobre a hipótese de ter algo em comum comigo. Isso reinventa sua rotina e traz um pouco de magia. Assim, me afasto, não sem antes dar um leve tropeção, o salto se enganchara em uma pedra. Esse o único ponto destoante de uma visita perfeita.

ELIANE BRITO, é escritora, cronista, advogada. eliane@rodovalho.com.br

sábado, 22 de agosto de 2009


Candidato ficha limpa

21/08/2009
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Tenho mania de fazer listas. Todos que me conhecem sabem disso. Dias atrás, certo amigo comentou comigo que existe um movimento em crescente ascensão na internet e também na sociedade para se votar somente em políticos que apresentem uma ficha limpa. Imaculada. Nenhum deslize no currículo, nenhum processo nas costas. Rapidamente, respondi, com um tom de ironia na voz: –É justo! Afinal, para se governar um povo ordeiro, cumpridor das leis, metódico como o brasileiro, isso é essencial.Sinceramente, utopicamente eu acho a ideia perfeita; porém, não sei se na prática esse candidato com postura europeia sobreviveria em solo tupiniquim. Esse ser primoroso que queremos eleger será (em uma versão melhorada do dito popular): “a vestal em meio ao bordel”. Certamente, teria grandes dificuldades para sobreviver em nosso meio político. Mas vamos lá! Vou fazer um exercício de abstração e apresentar a vocês as qualidades de meu candidato ideal: 1. Justo; 2. Leal; 3. Bom desportista; 4. Honesto; 5. Tolerante; 6. Compassivo; 7. Benevolente; 8. Educado; 9. Digno; 10. Carismático; 11. Amoroso; 12. Bonito (não abro mão desse item, se os americanos conseguiram, nós também podemos); 13. Inteligente; 14. Graduado em curso superior ou com uma boa formação; 15. Bom administrador; 16. Pai de família; 17. Defensor dos animais; 18. Defensor do meio ambiente e por aí vai. Quando cheguei nesse ponto, desisti... Percebi que nem Jesus Cristo se enquadraria nessa lista. Afinal, ele não era casado, item que para mim é essencial, pois demonstra certa estabilidade, solidez. Sei que esses critérios são polêmicos e questionáveis, mas é o que me ocorre no momento.Aí, resolvi fazer uma lista contrária, pequenos defeitos que seriam toleráveis, mas que para mim são essenciais para entrar na minha classificação “Cara gente boa”, são eles: 1. Beber uma de vez em quando; 2. Beber duas quando for preciso; 3. Falar um palavrão bem cabeludo quando irritado; 4. Andar despenteado e sorridente quando for necessário; 5. Chupar chicletes escondido, só pra lembrar a infância; 6. Dormir em meio a uma solenidade chata; 7. Soltar flatos como qualquer mortal (mas, dentro do banheiro do gabinete e aspergir bom ar, que ninguém merece!); 8. Mandar aquele chato, que sempre o desacata, pra PQP (afinal, ele não tem coração de barata!); 9. Viajar nas férias para a praia e ficar o dia inteiro coçando o saco e pensando em bulhufas. 10. Beijar a mulher apaixonadamente sem se importar com as câmeras. 11. Chorar diante de uma injustiça; 12. Decretar uma medida sem previsão orçamentária, porém, que beneficie milhões de famílias...De repente, entendi o que eu estava buscando com esse artigo. Eu procuro um candidato que seja humano. Que seja gente. Pode até já ter falhado. Fumado maconha sem tragar, copulado usando um charuto... Mas, eu tenho de sentir que ele é uma pessoa de verdade, alguém que valha a pena! Que erra, que acerta, entretanto, que consiga arrancar de mim um perdão instantâneo. Já dizia o bom e velho Ernest Hemingway, “Jamais faça negócios com quem não bebe uma dose de uísque.” Devo confessar que tenho pânico de gente “certinha demais”. Resumindo, tenho de sentir, que ele é o tipo do cara que eu convidaria pra uma festinha lá em casa.
Eliane Brito é cronista, escritora e advogada (eliane@rodovalho.com.br)

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

TENHO MEDO DO COLLOR!


Ai! Que canseira! Assistindo aos noticiários televisivos surge o palco do senado, em cena, dois titãs se digladiando. De um lado, o Ex-presidente da República, Fernando Collor, de outro, engrossando o “bate-boca”, O Sen. Pedro Simon. Além de sentir medo (é claro, com a carranca e o olhar maligno do ex-presidente), senti um desânimo tremendo.
Sabe aqueles pesadelos recorrentes? Quando você acha que o sonho acabou e no dia seguinte, sonha tudo novamente. Collor, assim como fênix ressurge das cinzas. E pensar que eu fui uma das “caras pintadas”. E pensar que eu fui um dos milhares de brasileiros que pediram o impeachment desse homem? De que adiantou? Pergunto cá com meus botões...
Os mesmos personagens se revezam no palco do poder. Somente em posições diferentes. De um lado o Presidente Lula, de outro Collor, em contraponto Sarney. Se fosse um jogo de xadrez, a diferença seria a função de cada peça. O peão virou rei, O rei virou bispo e por aí vai. Parece-me que o Sen. Collor se fechou, protegeu-se dos golpes e agora, que se sente curado, coloca as garras de fora. Mostra a verdadeira face que estava embutida, cheia de ódio, rancor e ameaças. Tenho pena dos brasileiros, que o reelegeram. Tenho pena também do próprio Collor, nem sua tragédia pessoal foi capaz de mudar sua natureza. Dizem que as pessoas mudam, mas, aí está a prova cabal de que toda mudança exige antes de tudo, um pequeno milagre. De vontade e transmutação.
Isso tudo me recorda uma história contada por Buda. Relata o iluminado que um monge que o servia, certo dia encontrou uma cobra ferida na floresta. Levou-a ao acampamento, cuidou da mesma com todo carinho, alimentou-a. O réptil reagiu, ganhou força, saúde. Certo dia, o monge decidiu que chegara a hora de reintroduzi-la no bosque. Coloca a serpente em uma caixa e a solta no meio do mato. Quando a cobra se afastava, sob o olhar atento do monge, de repente, retorna e o ataca no calcanhar. O monge regressa ao acampamento machucado, chateado e indaga do iluminado sobre o motivo dessa atitude do ofídio. Buda apenas responde: “Você foi fiel a sua natureza, que é a compaixão, a cobra foi fiel à natureza dela, que é o ataque. Não se pode mudar a natureza das coisas.”.
Penso que nosso querido Presidente Lula, tal qual o monge da história, acolhe Collor em seu regaço. Abre-lhe a portas do palácio, cura seu ferimento, o afaga. A única diferença é que não sabemos qual a sua verdadeira motivação. Tenho Medo. Penso que Presidente pode sair ferido. Nós brasileiros já estamos.


Eliane Brito é cronista, escritora e advogada. eliane@rodovalho.com.br

terça-feira, 4 de agosto de 2009

“OPERAÇÃO CHUPETA”

Era um final de tarde domingueiro. O dia transcorria lento e pachorrento como deve ser. De repente, minha filha, batendo a mão na testa, exclama: _ Nossa, havia esquecido, preciso fazer uma “chupeta”! Eu atônita, repeti a palavra com ar inquiridor. “Chupeta”? Ela sorrindo, explicou que, quando saíra de um barzinho na noite anterior e fora pegar o carro no estacionamento, descobrira que deixara as luzes ligadas e “arriara” a bateria. Portanto, seria necessária uma chupetinha (que é uma espécie de carga na bateria), para que a mesma voltasse a funcionar. Ela falava com propriedade, como quem domina totalmente os jargões das oficinas mecânicas. Inquiri sobre quem havia lhe ensinado aquilo e ela relatou que os funcionários do bar haviam lhe explicado. Achei o nome interessante, poderia ser título dessas operações da Polícia Federal.
Concordei e seguimos para o estacionamento do bar. Ao chegarmos, ela decididamente se dirigiu a fila de táxi estacionada e perguntou se algum dos motoristas tinha os apetrechos necessários para recarregar a bateria. Percebi que eu era a única pessoa ali que nunca havia ouvido falar sobre tão famoso procedimento. Ainda mais, com essa expressão...“ Chupeta”. Todos respondiam com naturalidade e não estranhavam a palavra. Por ironia e para reforçar o inusitado da situação, se aproximou uma mulher, identificando-se como taxista, prontificando-se para fazer o serviço. Com ar sério falou: _Olha, eu vou te cobrar só trinta pela chupetinha. Está bom pra você? Minha filha concordou. Estava precisando do carro. Eu confesso que achei caro. Parecia exagerado. Pelo que eu havia entendido, era um método relativamente simples.
Dirigimos-nos para o veículo, a taxista com dois fios grossos nas mãos. Um vermelho e outro azul. Logo atrás eu, conduzindo meu carro, que seria primordial para o sucesso da operação. Encostei o veículo perto do dela, abrimos os capôs e quando se preparavam para conectar os fios ligando as duas baterias, surgiu uma nova dúvida. A taxista exclamou: _peraí, qual fio é o positivo? Mais uma vez, exclamei, já rindo e achando a situação cada vez mais divertida. “Ah, então tem positivo ou negativo?” Eu heim...
Aí, como só acontece no Brasil, um senhor que passava e não tinha nada a ver com a história, se aproximou. Decididamente, falou: _tenho certeza que o fio positivo é o vermelho, o negativo é o azul. Nisso se materializa um outro homem e exclama: _Êpa, tenho certeza absoluta que é o contrário! Pronto. Em quem confiar... Todos sacamos dos celulares ao mesmo tempo. Ligações feitas, as informações continuaram contraditórias. Fiquei olhando, com ar desalentado aquele pequeno grupo que já se reunia próximo aos veículos, sem titubear mais, perguntei? _ O quê acontece se ligar o fio errado? Explode tudo? Ao que me informaram que não acontecia nada. Simplesmente não funcionava. Com uma sabedoria extraída de anos a fio, assistindo filmes de ação, falei: _liga o azul, pelo menos para desarmar bomba, sempre funciona. Esse fio vermelho, não vai dar certo não... O debate se acalorou. Eu, já levemente irritada, observando minha tarde de domingo se esvair, pus fim à questão: _É o seguinte, minha bateria já está arriando! Ou vocês fazem essa chupetinha logo ou vou embora, descobre aí, qual o positivo ou negativo da “repimbela da parafuseta”, antes que eu perca a paciência... Os fios foram conectados, até agora não sei qual cor acionava o quê. Acho que o positivo era o vermelho. O carro como que por mágica, funcionou. O ronco suave do motor ecoou no entardecer. Todos sorriem aliviados. Operação “chupetinha” concluída.

ELIANE BRITO, é escritora, advogada, autora do livro “Do Pequi ao sushi-Crônicas de viagens”. Saraiva. eliane@rodovalho.com.br

PRESENTES DA VIDA.


Hoje ganhei dois presentinhos maravilhosos... Meu coração está até apertado enquanto escrevo e olho suas carinhas peludas descansando aos meus pés. Ganhei dois cachorrinhos da raça “Lhasa Apsu”. São cor de caramelo e tão fofinhos que sinto que fui extremamente abençoada. Rapidamente digitei na internet o nome da raça procurando por informações. Descobri que são originários do Tibete. Treinados para serem guardas nos templos budistas. Calmos, inteligente e extremamente amorosos.
Mas, o que mais me impressionou, foi o fato de que para a cultura tibetana é importante ganhar esse cachorro. Ele deve chegar as suas mãos como um presente. E foi exatamente o que aconteceu comigo... Seria um sinal? Eles também acreditam que quem recebe um cãozinho desses em casa se torna extremamente abençoado. Crêem que é o cão quem escolhe o futuro dono, pois, a alma dos grandes sábios, que já alcançaram à iluminação, reencarna nesses animais.
E, olha que eles lutaram para estar ao meu lado. Assim que nasceram, o dono me procurou oferecendo os animaizinhos. Como eu não demonstrei interesse, pois moro em apartamento, acabei recusando. Nos últimos dois meses, ele voltou a me procurar, insistindo. Eu me mantive categórica. Irredutível em minha recusa. Até que hoje em um golpe de mestre tibetano, me aparece em casa levando as duas preciosidades no colo. Foi amor à primeira vista. Eu, que não queria nem um cachorro, me agarrei aos dois e não soltei mais.
E olha que vos escreve uma mulher de coração ferido. Já se vão um ano e meio que morreu minha cadelinha “Paris”. Jurei por todos os santos que jamais teria cachorros novamente. Minha dor na época foi tão grande, que não me sentia capaz de suportar outra perda. Pensando nisso, procurei lembrar dos ensinamentos budistas e fiquei olhando aquelas bolinhas peludas, durante a primeira hora de convivência e repetindo (para me confortar, é claro...): _Você vai morrer, sabia? Um dia você vai embora... Aplicava o ensinamento de Buda sobre a prática do desapego... Ele dizia que é importante “aprender a deixar as coisas partirem”. Desfrutar da convivência sem grande dedicação. E aceitar, quando chegar à hora da separação. Nada é eterno. A realidade é uma ilusão em constante mutação.
Mas, não adianta! Sinto que já me apaixonei! Estou perdida como todos os apaixonados... O cérebro não pode sobrepujar a emoção. E agora, já começo a repetir a seguinte frase: _ Vocês são lindos! Cheios de saúde e vão viver muito ao meu lado. Maria, minha secretária, que passava pelo cômodo nessa hora, exclamou: _ihhh! Já vi tudo! Se acontecer alguma coisa com esses cachorrinhos, você vai parar na UTI!
É isso mesmo. Não tem jeito de sentir uma emoção pela metade. Se for para amar que seja por inteiro. Com o risco da perda, do sofrimento, da dor. Eu aceito a aflição que eles possam me causar e aceito também todo o amor que eles trazem para mim. Eu nunca fui boa em desapego, mesmo. Portanto, sejam bem vindos!

ELIANE BRITO, é escritora, advogada, autora do livro “Do Pequi ao sushi – Crônicas de viagens.” eliane@rodovalho.com.br.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

ENXERGUE COM SEUS OLHOS


Fiquei pensando o que falar para minha amiga que me perguntava sobre o que eu aprendera de mais importante com a prática da meditação. Técnica que pratico há alguns anos. A resposta que me veio à cabeça foi essa: “Aprendi a enxergar o mundo novamente. Com meus próprios olhos.” Veja o que você enxerga e não o que os outros disseram para você enxergar. É isso mesmo. Quando você observar, que seja você quem tire as conclusões.
Olhe as coisas e as pessoas e tome novas direções, não através do preconceito ou de uma cortina de medo ou analisando pelas interpretações de outras pessoas. Quando estou com outro ser humano olho bem para sua face. As mentiras mais flagrantes estão ali retratadas, os grandes desejos estão ali expostos, os maiores fingimentos ali emoldurados, os mais intricados quebra-cabeças ali tatuados e as grandes revelações, desenhadas em seus rostos. Elas ficam ocultas apenas aqueles que se negam a ver. O que não é o meu caso.
Quando estamos confusos, perdidos no mundo, muitas vezes nos falta essa simples qualidade. OLHAR. Enxergar as pessoas que nos rodeiam. Aquelas que podem transformar nossas vidas e nos trazer novas significações. Quando enxergamos parece tão óbvia a solução. Como não vimos? Perguntamos-nos. Estava aqui! Na minha frente e eu não conseguia enxergar. Andamos pelo mundo como cego, confiando em sinais contraditórios.
Outra coisa que eu aprendi com a meditação foi que, meu caminho quem escolhe sou eu. Enxergo e faço a estrada por aonde vou. Reservo-me o direito de tirar as conclusões sobre os fatos da vida e definir qual o melhor sentido. Quando somos crianças, vemos o que nos mandam ver. Os adultos nos apresentam o mundo dentro de suas percepções. Mais é incrível lembrar como víamos além. Como éramos capazes de enxergar naquelas simples nuvens no céu, um maravilhoso e rechonchudo carneiro ou outra forma qualquer... Aprendemos a enxergar pelos olhos dos outros e empobrecemos nosso caminho. Agora simplesmente respeito o que é realidade para mim.
No mundo corporativo a verdadeira competência está baseada nesta habilidade, ou melhor, em todas as nossas habilidades de enxergar. Quando a realidade se apresentar, olhe bem aonde ela te leva e vá em frente!

Eliane Brito É escritora, advogada e autora do livro “Do Pequi ao Sushi - Crônicas de viagens.” eliane@rodovalho.com.br

quarta-feira, 24 de junho de 2009

SEJA ATIVO


Trabalho nem sempre é um prazer. Mas, apesar de às vezes, não ser uma alegria, temos de concordar que é um propósito que torna a vida menos chata. Quando não trabalhamos a pressão é imensa. Os desempregados que o digam. Além das contas que já fazem uma bela coação, ainda suportam os parente e amigos sempre questionando sobre uma atitude. Como mães, quando não trabalhamos, as crianças cobram e comparam com a mãe do amiguinho, que trabalha e lhe comprou o vídeo game mais caro. Um outro grupo que padece frente à opinião pública é o dos aposentados. Esse é um grupo que merece cuidados, pois, a atividade mental e física é importantíssima na terceira idade. Prevenindo uma série de transtornos. Essa turma necessita de políticas próprias, que lhes propiciem o retorno ao trabalho. Entretanto, hoje quero falar daquelas pessoas encostadas, entende? Sabe aquelas que estão esperando o mundo “acabar em barranco” para se ajeitarem melhor... Aquelas que não trabalham por uma crença pessoal de que essa é a melhor alternativa para suas vidas. Aposto que você conhece alguém assim e eu também.
Esse comportamento que antes seria uma aberração social, hoje em dia já incide sobre um grande percentual da população. Isso é muito comum nos países ricos onde o estado supre as necessidades das famílias. Nos EUA, onde o governo americano, através do “relief” (que em um comparativo, seriam os incentivos pagos pela nossa previdência social), oferece uma série de benefícios aos inativos, essa é uma questão preocupante. Sempre imaginamos que as pessoas não estão empregadas por que realmente não conseguiram trabalho, por motivo de doença, aposentadoria ou por que não terem qualificações. Porém, existe um percentual desse grupo que são os (chamarei assim...) optantes. Aqueles que realmente escolheram não trabalhar. Somente usufruindo os benefícios pagos pelo estado. Isso onera os cofres públicos. Aumentando a Crise americana.
Se a vida fosse uma viagem e cada um de nós perguntasse ao agente, qual a atração, as atividades, a serem desenvolvidas e ele nos respondesse que não haveria nenhuma... Com certeza seria uma grande decepção. Porém para os optantes acima, isso não causaria desagrado. Os “ociosos profissionais” resmungariam satisfeitos, com a visão de horas e horas de dolce far niente pela frente. Mantermos-nos ocupados com algo, mesmo as coisas simples, são atos essenciais para a nossa felicidade. De fato, talvez o conceito de moralidade esteja intrinsecamente ligado ao trabalho. Normalmente os vícios morais estão unidos à inatividade e ao ócio. Além do que, a vida ao lado de pessoas preguiçosas pode ser bem difícil. Pois, nós do grupo dos “raladores” acabamos assumindo suas funções e suprindo suas necessidades.
Cada um deve vasculhar os recônditos de sua alma e descobrir suas habilidade e talentos e observar em que direção apontam. Quando trabalhamos com prazer e vontade fazemos o bem para nós mesmos e para o país. A previdência agradece e os companheiros de jornada também. A estrada para a felicidade por incrível que pareça passa pelo trabalho e uma produção consistente.

ELIANE BRITO é escritora, advogada, cronista. Autora do livro “Do pequi ao sushi. Crônicas de viagens”. eliane@rodovalho.com.br Publicado no DM do dia 24 de junho de 2009.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

REENCARNANDO O MAL


Lidamos com as forças do mal neste planeta. Não há dúvidas! Além da violência que permeia nas grandes cidades do mundo, ainda temos guerra, fome, miséria, desigualdade, doença, etc. Para os que acreditam nas previsões bíblicas, os quatro cavaleiros do apocalipse já estão soltos. E, fazendo a festa!
Liderando esse movimento eu escalaria o ditador Pyongyang, dirigente da Coréia do Norte. Sua realização de um teste nuclear foi à notícia da semana. Para complementar ainda lançou dois mísseis, em direção ao Japão, em uma tentativa clara e patente de disseminar o terror. Assistindo ao noticiário, que transmitia uma parada militar coreana, observando a pose do ditador - de braços erguidos e saudando os soldados - veio a minha mente como um flash o seguinte pensamento: “­Esse homem é a reencarnação de Hitler!” Se não da forma literal, pelos menos estão irmanados em idéias e aspirações.
Foi um pensamento ilógico, eu sei... Mas retrata bem a insanidade e a frieza de objetivos evocados pela imagem. Uma coisa eu descobri em minhas andanças pelo mundo e pelo oriente. O mal, onde quer que você o encontre, sempre tem a mesma cara determinada e feroz, de quem tem sede de sangue e destruição.
A predominância desse sentimento no mundo não ocorre somente nessas decisões políticas e estratégicas, nas altas esferas de comando. O que me assusta verdadeiramente é que a influência dos poderes das trevas parece estar em toda parte. Infiltrou-se na vida comum, no dia-a-dia do homem médio. Turbinado pela revolução industrial e tecnológica. A crueldade permeia solta em todos os ambientes. Você pode verificar isso na escola, onde adolescentes organizam brigas de rua para colocarem o vídeo na internet (numa demonstração de selvageria e barbarismo medievais), espancam os colegas em frente às câmeras em uma “saudável diversão”; Nos lares, onde o egoísmo e o desamor campeiam e a palavrinha “respeito” perdeu todo o significado para essa geração; No ambiente de trabalho, onde a competitividade e o amor ao dinheiro respaldam os atos mais vis.
Começo a pensar que talvez a grande responsável pela disseminação da violência tenha sido a rede mundial de computadores. Essa que nesse momento eu utilizo. Com a facilidade das comunicações via e-mail e outros instrumentos, as pessoas se perdem e não conseguem utilizar essa ferramenta magnífica com a cautela exigida.
O mundo parece infectado com um vírus mais letal que o da gripe suína, ou seja, qual sigla se queira usar. Esse vírus e um vírus de morte, sim! Lenta e sistemática. É um vírus de guerra, de destruição, da raça humana e do planeta! Que Deus nos dê forças para reagir com a melhor das armas. A sabedoria infinita, que fará com que não reencarnemos o mal, reencarnemos sim a paz e a bondade.

ELIANE BRITO, é escritora, cronista, advogada, autora do livro “Do pequi ao sushi-crônicas de viagens”. eliane@rodovalho.com.br

quinta-feira, 28 de maio de 2009

ADULTESCÊNCIA.


Um fenômeno cada vez se torna mais comum. A adultescência. Esse neologismo, surgido da junção das palavras, adulto e adolescência, é cada vez mais usado pelos psicólogos. Uma pessoa amadurecida, que após os quarenta anos, apresenta postura típica de um ser na puberdade. Contestam, deixam o cabelo crescer, fazem tatuagens, viajam por meses a fio, compram motos, se permitem coisas que não se permitiram na juventude.
Conversando com uma amiga, sobre a transformação pela qual passara seu marido –que de empresário sério se transmutara em uma mistura de roqueiro com motoqueiro- ela com cara desconsolada me disse: _ Amiga, depois de velho ele resolveu ficar jovem! Sua resposta retrata o drama ocasionado por essa tendência. A busca da juventude perdida incomoda. Um monte de gente! A descoberta de que esses jovens adultos podem ter muito vigor e saúde para explorar o mundo, desloca paradigmas.
Na verdade, o grande mote do ser humano é a busca, única, pessoal e intransferível de algo que dê sentido às suas vidas. Quando somos adolescentes, nos deparamos com aquela que será a nossa grande companheira, por um bom pedaço de estrada, a dúvida. Essa criatura está sempre assoprando em nossos ouvidos: Será? Será que meus pais estão certos? Será que essa ideologia é a correta? Essa é a melhor forma de se estruturar a sociedade? Casamento, será? Teoricamente, todas essas dúvidas seriam respondidas no período maduro da vida. Adulto seria aquele detentor de todas as respostas e certezas, será?
Perdemos nas últimas gerações o hábito de questionarmos profundamente sobre as questões da vida. Na década de sessenta, quando a educação tinha um caráter holístico, o costume da reflexão era afiado pelo estudo, desde os mais tenros anos, de filosofia, sociologia, teologia, etc. Hoje em dia o comando é outro. Celeridade. Rapidez. Fazer e acontecer. A internet é a grande unificadora do planeta. Você só existe se o seu nome estiver no google. Nem que seja nas páginas do orkut.
A palavra da hora é reinventar. Mudar sempre e em processo acelerado. E aí, as pessoas se descobrem mais... Mais roqueiro, mais aventureiro, mais desbravador, mais zen, mais marombeiro... a lista é infinita. E o bom é que não precisamos de adolescência para isso. Podemos nos transformar a qualquer tempo. Saramago disse, em seu Ensaio sobre a cegueira: “Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos.” Que seja garantido mais esse direito no mundo moderno. O direito de se procurar e se achar. Caso isso não ocorra, continuar procurando... Se você é mulher, marido ou filho de um adultescente, digo apenas, aplauda e apóie!

ELIANE BRITO, é escritora, cronista, advogada, autora do livro “Do pequi ao sushi - Crônicas de viagem.” eliane@rodovalho.com

terça-feira, 26 de maio de 2009

RONALDINHO, RONALDINHO...


Olhando o rosto cínico e debochado de um criminoso (que matara e esquartejara uma jovem) no momento em que lhe era lida a sentença, senti minha face pegando fogo. Não tenho dúvidas de que no cursinho básico de direito penal, que ele já participara na prisão, seus colegas o alertaram de que aquilo ali não iria dar em nada, ou muito pouco... A sentença arbitrou vinte e um anos de reclusão. Na prática ele ficará encarcerado em torno de sete anos ou no máximo oito.
Uma das principais teorias do Direito Penal é a relação de causalidade. Todos os elementos que contribuem para a existência do resultado devem ser levados em consideração. Em decorrência lógica à prática de crimes, ocorre a punição. Isso no maravilhoso mundo das idéias, do abstrato. Em nosso país é diferente. Nesse intervalo entre o crime e a punição muita coisa vai acontecer. As leis penais estabelecem um acordo tácito com o cidadão. Não proíbem nada, apenas descrevem uma conduta e prevêem uma pena caso a mesma venha a ser infringida. Deste modo, de onde decorre o medo da punição? Da crença geral que alerta: _Olha, se você praticar essa conduta, a punição poderá ser de pena de prisão, cadeia mesmo... E assim, os dispositivos penais vão coibindo a prática de determinadas ações que prejudicariam a vida em sociedade.
Entretanto, no Brasil não é isso que ocorre. Nós, advogados, que vivemos o dia-a-dia dos tribunais e também o cidadão comum (que a tudo acompanha de olhos arregalados em frente à televisão), ficamos indignados com o sistema penal da forma que está estruturado. Para começo de conversa, existe um limite legal (art.75 CP) que diz que o criminoso não pode cumprir mais do que trinta anos de cadeia. É o cúmulo! Essa disposição garante que verdadeiros monstros sejam colocados em liberdade. Aí, você pode me dizer: _ Existe a lei dos crimes hediondos, ela é mais severa. Eu te responderia: _Que nada! Os tribunais superiores já descaracterizaram totalmente essa lei, permitindo progressão de regimes, liberdade condicional, etc.
A impressão é de que a justiça trabalha para que o bandido desfrute de sua liberdade. Enquanto isso, os aqui, pagadores de impostos, moram em verdadeiras fortalezas. Os mais abastados em condomínios fechados, com sistemas avançados de segurança. Os mais humildes em pequenas prisões particulares, com grades, câmeras, portões eletrônicos, cachorros ferozes. Mesmo assim, sem o sentimento de segurança.
Nosso código penal data de 1940, com algumas reformas posteriores. Chegou à hora de mudar. E mudar para endurecer a legislação. Devemos pensar que a justiça não é feita para o cidadão comum. A justiça criminal é feita para aqueles que infringem a lei. Felizmente a prática demonstra que em países onde a legislação é mais severa existe uma ligação direta, um nexo de causalidade, entre a gravidade da pena e a diminuição no número de crimes. Precisamos fazer algumas mudanças com urgência. O poder legislativo precisa se mobilizar e ter a coragem para fazer as alterações necessárias.
Vivemos no país dos subterfúgios e estratagemas, assim, pensei em algo que prendesse sua atenção, caro leitor. Portanto, o título foi somente um chamariz, queria tratar na verdade era de reforma penal mesmo!

ELIANE BRITO é escritora, advogada e cronista. (eliane@rodovalho.com.br) Publicado no DM do dia 20 de maio de 2009.

terça-feira, 12 de maio de 2009

“MÃE, amor incondicional.”

"Batatinha quando nasce,
se esparrama pelo chão,
mamãezinha quando dorme
põe a mão no coração."

O ano era 1984. Na época eu era uma adolescente atrevida de quatorze anos. Cara a cara com minha mãe eu a desafiava. Com a mala pronta, preparava-me para deixar a cidadezinha onde havia crescido e mudar para Goiânia. Iria cursar o segundo grau. Mamãe com voz chorosa pedia para que eu não fosse; que continuasse estudando ali e mudasse só por ocasião da faculdade. Eu irredutível. Argumentava com convicção: _Mãe, coloca uma coisa na sua cabeça, minha vida nunca vai ser igual a sua, está entendendo? Você acha que eu vou passar minha vida sendo uma mera “dona de casa”? Falei com ar desdenhoso. Ela cabisbaixa somente respondeu: _ Tenho muito orgulho de ser dona de casa! Com um olhar profundo e triste me fitou e disse: _ Está bem, minha filha, vai com Deus! Peguei a mochila joguei nas costas e puxando a mala, segui, sem olhar para trás.
É incrível como passei tantos anos da minha vida perseguindo esse objetivo. Ter uma vida diferente de minha mãe... Em minha superioridade, me policiava até para não repetir gestos ou trejeitos típicos dela. Como podemos ser tão cegos para não perceber os anjos que Deus coloca em nosso caminho. Durante minha vida despedi muitas vezes de minha mãe e essas cenas me marcaram. Lembro-me de sua expressão de terror quando, me despedia dela em particular, antes de cada parto. Deitada na maca sempre falava a mesma coisa: _Mãe, se eu morrer cuida das minhas filhas! E ela passava a mão na minha testa e dizia você não vai morrer não... quando você sair eu estou aqui te esperando. Deus te abençoe! Bastavam aquelas palavras para eu me sentir mais forte. Palavras que dissipavam o medo.
Minha vida é como um mar turbulento. A de minha mãe plácida, contemplativa, como um lago. Nunca vivenciou a maioria das coisas pelas quais lutei. Aprendi a andar de bicicleta quando criança e ela comentava com todos orgulhosa, nunca aprendera... Aprendi a nadar, ela ali, me aplaudindo. Tinha pavor de água. Aprendi a dirigir, ela andava ao meu lado toda orgulhosa. Nunca veio a aprender. Quando me formei, o único olhar da platéia que me interessava era o dela. Estava ali, com os olhos marejados de lágrimas. Levantei o canudo e sacudi em sua direção. Afinal, o diploma era mais dela do que meu. Quando recebi meu primeiro salário. Fiz uma festa! Ela bebeu até uma taça de vinho... Ao contrário de mim, não bebe nunca! Eventos, recepções, minha mãe lá... assando bolo, polindo os móveis, me recebendo sempre com um quitute, um mimo. Viajei, rodei mundo, ela ali, firme, administrando minha casa, cuidando de minhas filhas, orando para que Deus guardasse os meus caminhos.
Nesse ínterim fui relaxando. Fui deixando que ela sobrevivesse dentro de mim. Que os seus exemplos e ensinamentos crescessem em minha vida. E hoje, olhando minha história, vejo o quanto tenho dela. Quando deito minhas filhas no colo e faço um cafuné, não sou eu que está lá, é ela. Quando faço um jantar gostoso e fico fiscalizando em volta da mesa, repondo os pratos vazios, ela está nos meus gestos. Quando minhas filhas saem para a balada e eu acendo uma vela para Nossa Senhora, será que sou eu mesma quem acendo? Quando aconselho, chamo a atenção, às vezes posso vê-la falando pela minha boca. Ela faz parte de mim, é inegável. E as cenas vão se repetindo e recriando. Há pouco tempo atrás, quando ela foi passar por uma cirurgia, estava na maca para ingressar no centro cirúrgico, olhou nos meus olhos e falou: _filha, estou com medo de morrer! Se eu morrer, você cuida do seu pai... Eu senti um pavor tremendo quando ela disse isso, mas, me controlei e respondi com segurança enquanto passava a mão na sua testa: _Mãe, você não vai morrer, não... Quando você sair eu estou aqui te esperando. Vai com Deus! E assim fiz.
Hoje, penso em como seria rica, se tivesse tido uma vida exatamente como a de minha mãe. Vida que se nutriu nas paredes do lar, no relacionamento profundo com os filhos, no cuidado, no amor incondicional. Minha vida de mulher moderna me roubou algumas dessas coisas. Deu-me outras é certo... Mas, algumas experiências que ela viveu eu jamais vou viver e lamento... Somente por hoje quero ser poetisa e escrever o poema mais sublime, feito de uma só palavra, a mais perfeita que existe. Mas, antes vou enfeitar esse poema com cobertores quentinhos, sopas gostosas, cafunés, sonhos realizados, sorrisos, lágrimas, vick vaporub, compressas quentes, pavês, biotônico fontoura, cantigas de roda, assombrações e muito, muito amor. Esse poema tão especial se escreve assim: “MÃE”.

ELIANE BRITO, é advogada, escritora, compressas cronista e a filha mais orgulhosa do mundo. (eliane@rodovalho.com.br) Publicado na revista M.F.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Parabéns a todas as mães!


Linda essa mensagem que recebi hoje e compartilho com todos vocês:


Uma criança pronta para nascer perguntou a Deus:- "Dizem-me que estarei sendo enviado à Terra amanhã... Como eu vou viver lá, sendo assim pequeno e indefeso?"E Deus disse:- "Entre muitos anjos, eu escolhi um especial para você. Estará lhe esperando e tomará conta de você."Criança:- "Mas diga-me: aqui no Céu eu não faço nada a não ser cantar e sorrir, o que é suficiente para que eu seja feliz. Serei feliz lá?"Deus:- "Seu anjo cantará e sorrirá para você... A cada dia, a cada instante, você sentirá o amor do seu anjo e será feliz."Criança:- "Como poderei entender quando falarem comigo, se eu não conheço a língua que as pessoas falam?"Deus:- "Com muita paciência e carinho, seu anjo lhe ensinará a falar."Criança:- "E o que farei quando eu quiser Te falar?"Deus:- "Seu anjo juntará suas mãos e lhe ensinará a rezar."Criança:- "Eu ouvi que na Terra há homens maus. Quem me protegerá?"Deus:- "Seu anjo lhe defenderá mesmo que signifique arriscar sua própria vida."Criança:- "Mas eu serei sempre triste porque eu não Te verei mais."Deus:- "Seu anjo sempre lhe falará sobre Mim, lhe ensinará a maneira de vir a Mim, e Eu estarei sempre dentro de você."Nesse momento havia muita paz no Céu, mas as vozes da Terra já podiam ser ouvidas. A criança, apressada, pediu suavemente:- "Oh Deus, se eu estiver a ponto de ir agora, diga-me por favor, o nome do meu anjo."E Deus respondeu :- "Você chamará seu anjo de ... MÃE!"

quarta-feira, 29 de abril de 2009

NÃO PANDEGUEIS, OU SIM...


Pândego, para o dicionário, adj. ou subst masc, que significa “que ou quem gosta de pandegas, brincadeiras. Divertido ou estróina”. Eu, como fã incontestável de Machado de Assis, de vez em quando me arrisco a usar essa palavra. Resolvi afeminar o adjetivo quando me referi a certa tia, famosa por seu bom humor... Estorcendo-me de tanto rir com suas histórias, falei: ­_Tia, você é uma pândega! Ou melhor, plagiando o Capitão Nascimento do filme Tropa de Elite, “a senhora é uma fanfarrona!” Ela me contava suas aventuras e eu me contorcia de rir com sua criatividade e ousadia.
Relatou-me que foi a um empório, perto de sua casa, para comprar o lanche da tarde. Quando estava posicionada no caixa, para logo atrás uma moça muito fina, vestida com esmero. Titia segurava dois potes de sorvete -sendo um diet- uma coca-cola e pães para o lanche. O caixa já muito seu amigo falou: _Dona “B”, são cinqüenta e quatro reais. Não se contendo ela muito séria, olhando para a moça, falou: _Minha querida, você pode pagar para mim? Estou olhando aqui e acho que esqueci o dinheiro em casa e não posso voltar sem esse lanche de jeito nenhum... Principalmente o sorvete diet... Meu marido é louco por sorvete e seu entro em casa sem... Já viu... É um Deus nos acuda! Ele me mata! Vamos fazer assim, você paga, eu te dou meu endereço e depois você passa lá pra receber, é aqui pertinho. A moça com ar atabalhoado perguntou: _Como? A senhora quer que eu pague suas compras? Titia firme e muito séria respondeu: _Sim, paga que depois eu te pago. O operador do caixa que já conhece a figura há muitos anos, rolava na cadeira de rir. A fila crescendo, todos esperando a resolução do impasse. A moça desconcertada olhou para trás, todos aguardando. Alguém gritou que resolvessem logo a questão. A tensão pairava no ar. Por fim, sem saída, concordou: _ O.K !Depois a senhora me passa o seu endereço. Disse isso enquanto sacava da carteira. Todos respiraram aliviados. Titia então abriu a caixinha protetora do celular e deu um grito de alegria: _Nossa tinha esquecido, tenho uma nota de cem reais aqui! Mas, nem ela mesma resistiu e começou a rir desbragadamente (também adoro essa palavra) com cara travessa. A moça quando viu a esparrela que havia caído, caiu no riso, assim como todos no pequeno mercado.
Certo dia levantou-se cedo, seis da matina, arrumou-se e falou para o marido que estava indo fazer um curso para aprender a dar banhos em cachorros. Ele sem entender nada, ainda argumentou: _Banho em cachorro? Pra quê? E ela firme. _ Vou trabalhar em um Pet Shop, nunca trabalhei e meu sonho é dar banho em cachorro todos os dias! Pois bem, quando saiu de casa já a esperava o carro da auto-escola. Com seus cinqüenta e tantos anos havia se decidido a aprender a dirigir. Iniciou o curso e todo dia era a mesma ladainha... O marido reclamava, ela ignorava e seguia firme rumo ao objetivo. Foi uma festa o dia em que ela nos mostrou a carteira de motorista. Com seus quase sessenta anos conseguira ser aprovada. Esse foi um dos poucos dias em que eu quase a vi chorando. Quase... Por que o sorriso e a alegria de viver são suas marcas.
Mas eu tenho cá com meus botões, que ela na verdade não gosta de brincar, não... Ela gosta de fazer pequenos testes com as pessoas. Através dessas situações do dia-a-dia, verifica como estão os níveis de confiança, honestidade e generosidade dos indivíduos que a cercam. Será que o LULA, por exemplo, que segundo o OBAMA, “é o cara!”, passaria nesse teste do empório? E quantos maridos seriam aprovados no teste do pet shop? Com o seu bom humor ela testa e aprova ou reprova um monte de gente. Mas, a generosidade dela é tão grande, que nunca relata as experiências que não deram certo. Se Deus tivesse criado um mandamento, “não pandegueis”, sem dúvidas ela não respeitaria. Nem eu.

Eliane Brito é advogada, escritora e cronista. (eliane@rodovalho.com.br) Publicado no DM do dia 22-04-09. Com alterações.

domingo, 19 de abril de 2009

Primeiro encontro



18/04/2009
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Ela se sentou na minha frente soluçando. Grossas lágrimas escorriam por sua face. Levantei-me e passei para o outro lado da mesa, segurei suas mãos e percebi a gravidade da situação. Seu desespero, sua angústia. Falei com calma: – Vamos, conte-me tudo. O que aconteceu? Ela então me respondeu chorosa: – Pus tudo a perder! Sabe aquele rapaz por quem eu estava apaixonada há meses? Assenti com a cabeça. – Convidou-me para sair e eu... (engasgou com os próprios soluços) eu... Acho que só falei bobeira, estava muito nervosa, devo ter feito tudo errado... Ainda por cima engasguei com o vinho, saiu vinho até pelo meu nariz! Falou de supetão! Quando saíamos do restaurante, escorreguei, caí sentada! – Já se passou quase uma semana e ele ainda não me ligou! – exclamou.Soltei suas mãos e me afastei um pouco, avaliando a situação. Enquanto isso, ela chorava como se tivesse assassinado alguém. Parou um pouco quando respondi: – E daí? O quê é que tem? Ela me olhou um pouco chocada e respondeu: – Ele deve estar pensando o quê de mim? Que sou uma retardada? Respondeu chorosa.Eu comecei a achar a situação realmente divertida. Estava preparando um artigo altamente complexo sobre a “flexibilização das relações de trabalho” e de repente ela me entra assim, na minha sala, estranho personagem de um drama. Falei conciliadora: – A etiqueta moderna é muito flexível, não se martirize assim... Sentei-me novamente e falei:– Se você está me contando isso é por que confia em mim, certo? Ela assentiu. – Bom, a minha experiência de vida me ensinou que quando um homem gosta realmente de uma mulher essas questões não têm a menor importância. Se ele gostar realmente de você, ele vai intuir tudo o que você é, seu caráter, sua personalidade. Por outro lado, se ele não te procurar mais, esquece! Falei categórica. Não vale a pena! Brinquei: – Esquece esse bobo! Mas ela continuava choramingando... Perguntei:– Ele conhece sua família, sua criação? Ela respondeu: – Sim, ele é amigo do meu irmão. Falei: – Pronto! Se ele gostar de verdade de você, ele vai ligar! Pode ter certeza! O amor está acima dessas regrinhas de etiqueta. Inúmeros casos na história retratam pessoas que viveram grandes amores que começaram com situações trágicas. No futuro vocês ainda vão rir disso. Falei com convicção.Quando ela saiu, fiquei meditando. Se eu fosse homem, quando saísse à primeira vez com uma mulher, provavelmente outras coisas me chocariam. Por exemplo, se saíssemos para jantar e ela pedisse uma picanha enorme e suculenta. Seria uma indecência! No mundo verde em que vivemos, esse atentado à natureza me assombraria. Ou pior, idealizei... Se ela acendesse um cigarro, aí, sim, seria o fim. Um verdadeiro atentado ao pudor! Além de não se preocupar com o mundo, não cuida nem dela mesma. Deixei-me dominar por essas digressões. Imagina, se ela fosse fã do Bush, defendesse a matança das baleias, andasse em carro movido a gasolina? Sei lá, odiasse crianças e cachorros! Mas o fato de ela ser uma desastrada não a desabonava. Absolutamente.Dois dias depois, a cena se repete. Ela, ofegante, invade a minha sala. Segurando o coração, olhos esbugalhados, tenta falar, mas não consegue. Levanto-me e pergunto: – E aí? O que aconteceu? Ela recupera o fôlego e fala com voz esganiçada: – Ele me ligou! Chamou-me para jantar hoje! Nisso a mulherada do escritório todo invade a sala, rindo e pulando de alegria! Eu, aliviada, exclamei:– Não falei que ele ligava? Sem me conter, aderi ao grande abraço coletivo. Ela agora chorava de alegria e nós – bando de comadres – chorávamos junto. Como última recomendação, adverti: – Presta atenção! Pede só um peixinho e uma saladinha e vê se não engasga! Melhor, fica muda e não faça movimentos bruscos! O riso foi geral!


Eliane Brito é escritora, advogada, cronista e autora do livro Do pequi ao sushi – Crônicas de viagens (eliane@rodovalho.com.br)

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Adaptação do excelente livro de Bahá ‘-U-lláh’, líder espiritual da antiga Pérsia (1817-1892).
“Oh, meu amigo, ouve com teu coração e tua alma as canções do Espírito, e tem com elas o mesmo cuidado que tens pelos teus olhos”.
“Pois a sabedoria do céu, assim como as nuvens da primavera, não descerão sobre ti todos os dias”.
“Mesmo que a graça do Todo-Poderoso continue sempre a fluir, há momentos em que uma parte dela é colocada de lado, para que tu possas compreender a suprema misericórdia. Por isso, entende que a nuvem que hoje despeja as bênçãos de primavera não ficará ali para sempre, e procura aproveitar cada gota que cai”.
“Nem todo oceano tem pérolas. Nem todo ramo floresce. Nem todo rouxinol canta com suavidade”.
“Então, faz um esforço para ouvir com teu coração e tua alma as canções do Espírito, porque elas chegam e partem”.

Muitas vezes não enxergamos as bençãos que nos rodeiam. As pessoas maravilhosas que nos amam. Mas, que Deus sempre as conserve por perto para aprendermos mais do amor e da vida.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Diário de uma vegetariana.


Sinceramente eu achei que me conhecia. Sempre tenho uma resposta pronta quando me indagam sobre alguma questão e respondo com segurança. Quando declarei que não mais comeria carne, muitos me perguntaram se eu achava realmente possível viver sem proteína animal? Argumentaram que seria muito difícil. Eu rebatia com convicção: _Nada é difícil quando se está determinado. Meu sorriso jocoso e superior contava da minha resolução, porém o caminho se mostrou árduo.
Acho que o desejo de parar completamente de comer esse alimento surgiu na minha viagem de férias, no final do ano. Foi um sentimento indefinido que foi crescendo enquanto eu observava as grandes fazendas do estado de Mato-Grosso do Sul, com milhares de cabeças de gado salpicando os campos. Olhando aquele contingente imenso de seres pastando tão placidamente, sem saber o destino que os aguardava, pela primeira vez na vida, juro, senti pena daqueles pobres animais. Outro fator que também contribuiu foi o contato intenso e direto com a natureza. Passei dias tomando banhos de cachoeiras, nadando em rios, andando no meio do mato e reconectei-me novamente ao planeta. Voltei a enxergar a terra e todos os seres. Sentidos que muitas vezes ficam embotados na cidade se reavivaram. Esse sentimento indefinível e amoroso se fortificou e tomei a decisão: _Não comerei mais carne! Será bom para o mundo e para mim.
Assim, cortei tudo que tivesse origem animal. Carne-vermelha, frango, presunto, salsicha, lingüiça, etc. Não imaginava como isso iria restringir meu cardápio. Nos primeiros dias foi muito difícil. Alimentava-me de duas em duas horas. Parecia que nada me saciava. Estava sempre com fome. Fui a festas onde fiquei observando os convidados comerem, enquanto eu apenas bebericava.
Notei que passei a consumir (principalmente em restaurantes) mais massas e doces. Reajustei a rota para evitar ganho de peso. Vencidas as duas primeiras semanas, aconteceu um fenômeno interessante. Passei a sonhar com carne. Certa noite sonhei a noite inteira que preparava suculentos bifes e comia com prazer. Síndrome de abstinência total. Lembrei-me do filme infantil Madagascar, onde o leão “Alex”, só pensava nisso, demonstrando como esse hábito é poderoso.
Vencidos os primeiros meses, os benefícios foram tremendos. Sinto-me mais leve, minha digestão ficou mais rápida e eficiente, estou mais calma e contemplativa. Não posso afirmar que é a carne somente, mas, minha agressividade diminuiu. Deduzi que consumir carne nos bestializa um pouco, ficamos mais nervosos. Além disso, ainda apresento um excelente argumento, o vegetarianismo nos deixa mais magros e para arrematar, as pesquisas indicam que a carne vermelha é altamente cancerígena.
Essa é uma mudança necessária para quem realmente se preocupa com o aquecimento global e a preservação do planeta. Recomendo. Tente e faça, quando você tiver vencido essa batalha se sentirá como eu...Mais consciente, participativo e forte!

ELIANE BRITO é escritora, advogada, autora do livro “Do pequi ao sushi-Crônicas de viagens”. eliane@ rodovalho.com.br Publicado no DM do dia 10 de abril de 2009, sexta-feira da paixão.

DE MAROLA EM MAROLA...



O céu se abriu sobre Goiânia. Era final de tarde e a chuva torrencial anunciava que São Pedro estava nervoso ou quiçá irado mesmo! Pelo volume de líquido que despejava havíamos sido condenados já em primeira instância a morrermos pelas águas novamente. O Todo-poderoso não iria permitir isso, pensei... afinal ele havia feito aquele velho acordo com Noé. Liguei o pisque - alerta, acendi os faróis, diminui a velocidade, enquanto observava o riacho por onde navegava. Sim, senhores! A avenida havia se transformado em um belo e caudaloso ribeirão, alimentado por vias marginais que o nutriam sistematicamente. Fui ficando apreensiva. A correnteza estava bem forte e a visibilidade péssima.
Estaquei. Logo à frente, um pequeno ônibus de transporte escolar havia batido em três carros provocando um engavetamento. Notei que não era nada grave. O trânsito ficou lento e penoso com o engarrafamento. O pequeno rio por onde navegava, a cada minuto parecia ganhar mais força. Enquanto prosseguia lentamente lembrei-me dos representantes do poder público colocando a culpa na população, responsável por jogar lixo nos bueiros. Será? Observando o caos, a total falta de escoamento, a engenharia das ruas (e olha que sou leiga nisso) tive a intuição de que o problema é mais grave do que se supõe. O estado sabe usar com maestria do subterfúgio de culpar o cidadão. É fácil culpar a coletividade e se imiscuir da responsabilidade. Difícil é assumir que os órgãos responsáveis pelo planejamento urbano, pela engenharia das vias, pelo esgoto, pelas canalizações não tem feito seu papel ou o faz de forma deficitária. É muito trabalho e demanda mudanças.
Cheguei à pracinha que faz a ligação da Avenida 136 e Rua 90 no setor sul. Em um grande telão luminoso, de frente para a praça, passava uma propaganda do Governo Federal. A chuva já havia arrefecido um pouco e parada ali no sinaleiro fiquei assistindo ao país de sonhos retratado nas imagens. Em tomadas aéreas visualizávamos fábricas, estradas perfeitas, lavouras, indústrias, crianças bem nutridas, etc. Quando acabou, exclamei em voz alta para meus botões: _Estamos na Suíça! É isso!
Aquele país mostrado nas telas não era o que eu estava vendo. De dentro do carro, observava o trânsito caótico, uma árvore tombada, os carros da polícia fazendo a ocorrência do acidente, etc. Mas, quem sabe o que estava enxergando não era uma ilusão? Talvez a realidade fosse aquela da tela... Imaginei-me presa em um mundo paralelo. Esperava que quando acordasse no meu mundo real, me aguardasse um Presidente com carinha simpática, sorriso estampado na face, que me tranqüilizasse dizendo assim: _Calma! Foi só uma marolinha!

Eliane Brito é escritora, advogada e cronista. Autora do livro “Do pequi ao sushi-crônicas de viagens”. eliane@rodovalho.com.br