sábado, 24 de janeiro de 2009

SIM, EU POSSO.


Sinceramente, me cansei de esperar que alguém transforme o mundo. Sejamos realistas. Concretamente, o quê se pode esperar de Barack Obama para o Brasil e ainda, para Goiás? Com as terríveis dificuldades que os Estados Unidos enfrentam em que ponto da pauta do presidente americano estará inserido o item, América latina?Preservei-me da histeria coletiva pela posse, chamem-me de cética ou desiludida, quem sabe... Mas, de uma coisa eu tenho certeza: Os primeiros movimentos desse presidente afetarão pouco minha rotina.
Ele tem problemas muito mais graves com que se preocupar do que questões envolvendo o panorama brasileiro. É inegável que, decisões tomadas na economia global, nos atingem de forma secundária. O desemprego pode aumentar, o feijão pode ficar mais caro, etc. Mas, não podemos esquecer que ele é presidente dos EUA, aqui o presidente atende pelo nome de Luiz Inácio Lula da Silva.Usando uma expressão popular, "eu odeio babar ovo para a cultura americana". Tenho sérias restrições a esse povo. Portanto, não compactuei com a alegria generalizada. O único ponto positivo que vejo na celebridade "Barack Obama" é o papel de líder, função que ele desempenha com maestria. Ciclicamente, os dirigentes nos lembram de nossa capacidade de transformação, de mudança. O papel de um chefe é trazer de volta a esperança, o poder de acreditar no futuro.
Quando estamos terrivelmente pressionados como agora, com violências, guerras, aquecimento global, soa como uma doce música quando alguém diz: “Yes, we can" ou “sim, nós podemos”. Essa frase evoca o poder do coletivo, a força da egrégora. Agir em bloco é importante. Só nos organizamos para o trabalho comunitário e social, quando cada indivíduo sabe o que quer... Qual o seu papel na engrenagem da sociedade.
Então, penso que chegou a hora de se fazer uma opção pessoal e única. “I can" ou “eu posso”. Eu posso mudar o planeta. Eu posso poluir menos. Eu posso consumir menos. Eu posso ser responsável pelo meu semelhante. No momento em que fazemos essa opção particular, geramos a energia que tudo organiza e fecunda. Toda mudança começa primeiro na vida de cada um de nós. Em cada lar, no nosso pequeno mundinho.
O ser humano só age quando compelido pelas circunstâncias ou por que se decidiu a agir. Assim, obrigado "Barack", por me lembrar que todos os dias eu pratico milhares de ações, que afetam o mundo, o meio ambiente e meus semelhantes. Obrigado por me levar a fazer escolhas, por me obrigar a dizer primeiramente: "Sim, eu posso".

ELIANE BRITO. É escritora, cronista e advogada. Autora do livro “Do pequi ao sushi- Crônicas de viagens.” eliane@rodovalho.com.br

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

RIO SUCURI



Fiquei parada alguns minutos, respirando profundamente olhando as águas tépidas e transparentes do rio Sucuri. Estava em Bonito- MS e me preparava para flutuar em um dos rios mais cristalinos do mundo. Tudo seria perfeito, se os instrutores, não tivessem me confessado que realmente existem ali, cobras sucuris, mas, que elas nunca atacavam... Porém, aquilo não me consolava.
Estava apreensiva. Vestida com a roupa preta de Neoprene, calçando botas especiais de borracha, para resguardar os pés de alguma rocha mais cortante, não me sentia protegida. Sabia que se sofresse um ataque, aquele aparato todo não adiantaria nada. Percebendo isso, os responsáveis pela aventura, se aproximaram e me deram algumas informações sobre os hábitos do ofídio. Disseram que ali o ecossistema era equilibrado, com oferta abundante de alimentos o que fazia com que há muitos anos não houvesse ataques. Além do mais, um biólogo esclareceu-me que a sucuri e a maioria dos animais não gostavam da carne humana . Fiquei até um pouco indignada e perguntei o por quê? Afinal, seria assim tão ruim... Ele brincou que o gosto não deveria ser bom. Somente atacavam se acuados ou ameaçados e caso existisse um grande desequilíbrio ecológico. Uma das instrutoras brincou que seria uma grande honra se a cobra passasse nadando na nossa frente. Se mostrando em toda sua magnitude. Eu fiz o sinal da cruz. Deus que me livre! Pensei.
Nessas horas questionamos todos os nossos conceitos sobre proteção ao meio ambiente. Quando pensamos nessa idéia, o que nos vem à cabeça é salvar as baleias, as ararinhas azuis. Animais bonitos e totalmente inofensivos. Quem encabeçaria uma campanha pela proteção das sucuris ou dos tubarões brancos? Na verdade defendíamos apenas o que não representava uma ameaça imediata. Mas, percebi que o direito á vida e a sobrevivência é muito mais amplo. Envolve todos os seres. Inclusive os predadores. Lembrei-me dos ensinamentos hindus, que pregam que todas as formas de vida são sagradas e exercem uma função importante na natureza.
Esse sentimento de respeito pelo palco abençoado do mundo me ajudou a ingressar no rio. Coloquei o Snorkel e respirando pelo estreito tubo, iniciei a descida. Pediram para que não fizesse movimentos bruscos e não tocasse de forma nenhuma no leito. Isso, para não levantar pedras ou cascalhos que atrapalhassem a visão. Emergi por alguns minutos e uma companheira de descida falou, reforçando meu medo: -“que nada! Não devemos tocar o fundo para não pisar na cobra, se você pisar nela, já era...! Estremeci. A tensão fazia com que todo meu corpo doesse. Procurei nadar o mais próximo possível da face do rio. Porém, aos poucos a magia do ambiente aquático foi me dominando... As águas eram cálidas e transparentes devido ao solo da região, riquíssimo em calcário, que funciona como um filtro natural depurando as impurezas, deixando as águas cristalinas. A quantidade de peixes coloridos e exuberantes era incrível. Dourados, piramutabas, pacus, faziam a festa em meio às pedras e aos corais. Lembrei-me que ali também era o habitat dos jacarés e das lontras, que, em caso de descontrole ambiental também podiam agredir aos seres humanos.
Em alguns pontos, o lençol freático que alimentava toda aquela maravilha, aflorava e formava pequenos vulcõezinhos de areia e água, jorrando das profundezas da terra o precioso líquido. Era um espetáculo realmente fascinante. Em determinado ponto, o guia, no barco de apoio que acompanhava o grupo, pediu que nadássemos rápido, em silêncio absoluto e o mais próximo possível da superfície. Coloquei a cabeça para fora da água e observei um guarda, parado em um ancoradouro, com os olhos fixos no rio, com um lança de madeira na mão, parecida com um arpão e uma espingarda encostada ao lado. Passei por esse ponto com a respiração suspensa. Minha intuição me dizia que ali, naquele local, deveria ser a toca do bicho. Nem sei como consegui prosseguir... O sentimento era do mais puro terror.
Quando chegamos ao final do percurso de aproximadamente três quilômetros, a sensação geral era de alívio e deslumbramento. A natureza era perfeita. Comecei a lamentar que a cobra não tivesse aparecido. Teria sido a cereja em cima do bolo... O gran finale, o toque mágico e perfeito para todo aquele esplendor! Argumentaram que eu só estava falando isso por que estava fora da água... Ameaçaram-me jogar no rio de volta e eu me esquivei correndo... Todos gargalharam... Quando estamos longe do perigo é mais fácil manifestar coragem. A conclusão que tiro é que aprendi a respeitar um pouco mais a vida dos animais. Com uma ressalva, eles lá e eu aqui.

ELIANE BRITO.
É escritora, cronista, advogada, autora do livro “Do pequi ao sushi- crônicas de viagens”. (eliane@rodovalho.com.br)

CORAGEM E FORÇA PARA AVANÇAR


Aristóteles disse: “A coragem é a primeira qualidade humana, pois, garante todas as outras.” Suspensa a dezesseis metros de altura, presa por um cabo de aço, lembrei-me claramente dessa frase, enquanto uma pergunta martelava na minha cabeça: _ O quê estou fazendo aqui? Havia resolvido praticar arborismo, técnica que nos permite, presos por cabos de aço, caminhar por sobre as árvores, com diferentes níveis de dificuldade. Quando me escrevi no programa, o instrutor havia me alertado que aquele não era um arborismo comum, desses praticados em colônia de férias... Apresentava um nível de dificuldades bem alto, sendo procurado até por praticantes de alpinismo. Mas eu, não havia acreditado... Agora estava ali, segurando em uma rede, suspensa no ar, com os tendões do braço parecendo que iam se partir a qualquer momento. Em um esforço hercúleo, consegui mover as pernas, liberar os braços e alcançar a plataforma de madeira, que servia de ponto de descanso para a próxima etapa.
O suor escorria pelo meu rosto, quando o instrutor me perguntou se estava tudo bem... Assenti e pensei: “Agora virou questão de honra! Vou até o final...” a próxima etapa era um caminho composto por minúsculos quadradinhos de madeira de 10 cm², dispostos a intervalos regulares de aproximadamente trinta centímetros e mais nada. Em baixo divisava um emaranhado de vegetação e árvores. Para apoiar, corrimões de cabo de aço, que à medida que pisávamos, abriam cedendo de forma perigosa, forçando ainda mais os membros. Em alguns momentos quase desisti... o medo farejava meus passos. Não me esquecia que a altura era equivalente a um prédio de seis andares.
Havia visto um documentário tempo atrás, que mostrava como executivos participavam dessas atividades para trabalharem a autoconfiança, determinação e coragem. Todos esses ingredientes e ainda acrescentaria uma dose de ousadia, realmente realizam grandes proezas. Porém ali, com os braços doloridos, arfante, a vontade era de abandonar a empreitada. Mas, nesses momentos onde parece que tudo está perdido, o corpo parece nos suprir com uma reserva extra de arrojo e teimosia e assim, prossegui...
Comecei a última etapa do percurso (duas decidas rápidas em tirolesa) orgulhosa e maravilhada com a minha coragem. Muitas vezes, para se conseguir progredir na vida é necessário apenas um bom ponto de apoio. Esse ponto nos garantirá que avancemos e no final alcancemos a vitória. Deslizei pelos cabos, que me jogaram na água, destino final da aventura, sorrindo como uma criança. Fiquei ali, boiando e relaxando e sentindo o sabor maravilhoso que só existe quando superamos nossos limites e alcançamos algo por nosso próprio esforço.


ELIANE BRITO
É escritora e cronista, advogada, autora do livro “Do pequi ao sushi- Crônicas de viagens”. (eliane@rodovalho.com.br) Crônica publicada no DM do dia 11 de janeiro de 2009.