quinta-feira, 14 de outubro de 2010

A Liberdade de um tênis velho.

Paguei pelo tênis novo, já antevendo o prazer que sentiria, no dia seguinte, em minha corrida matinal. Sai da loja com um sorriso no rosto e a certeza de uma boa compra. Na manhã seguinte, ao nascer do dia, desembarco em um parque da cidade. Alongamento, ajustes finais, começo um leve trote para aquecer. Êpa, ando cerca de cem metros e já percebo uma incômoda dor no pé esquerdo. O tênis estava me machucando, constato. Paro, tiro do pé, ajeito o cadarço, calço novamente. Tudo em vão, após uma curta distância, desisto. Todos os meus planos de vida saudável frustrados. Praguejo mentalmente e decido dar por encerrada minha ginástica matutina.

Procuro uma sombra agradável sob uma bela árvore, com a visão do lago a se descortinar a minha frente e resolvo meditar um pouquinho antes de ir embora. Quando estava conseguindo aquietar meus pensamentos, sou despertada por grandes formigas negras, decididamente subindo pelo meu corpo. Calma. Respiro profundamente e retiro os insetos da roupa, tomando cuidado para não matá-las. Afinal, elas tinham mais direito de estar ali do que eu. Ou não, como diria Caetano.

Já me livrando do mau-humor que lentamente tentava me dominar, sigo mancando em direção a um quiosque, onde um simpático senhor vende cocos verdes. Encosto-me no balcão e peço um coco gelado. Ele, gentilmente informa que não tinha. Só coco natural. Aceito. Pelo jeito o dia não respeitaria nada que eu planejasse para ele. A melhor saída era me adaptar. Apesar de ser sete horas da manhã, o sol já estava á pino. Bebo devagarzinho, observando as arvores totalmente verdes após as chuvaradas da primavera. Exuberantes com suas frutas e flores. Era incrível como após um inverno tão seco, a natureza reagisse tão rapidamente com as primeiras águas.

O vendedor então puxou conversa comigo. Perguntou se eu conhecia “jatobá”, mostrando-me os frutos, de casca marrom e dura, que estavam sob o balcão. Afirmei que sim. Fora criada às margens do Rio Araguaia, onde eram abundantes essas árvores. Ele então, apontou para a grande árvore de jatobá, de onde há pouco, colhera os frutos. Perguntei-lhe se ele me daria um fruto de presente, pois, “havia bem uns vinte anos que eu não comia desse alimento”. Ele concordou prontamente e abriu o mesmo para mim. Havia me esquecido do gosto acre e forte, de como era pegajoso e grudava nos dentes. Não era de todo mal.

O envelhecido vendedor então me falou que “mulher tinha que comer pouco jatobá, bem pouquinho...” Acrescentou que deixava as mulheres “muito fortes”. Falou isso, com um sorriso malicioso no rosto, estufando o peito. Não entendi. Então perguntei: “Forte, como? Com vontade de namorar?” Ele riu a valer, mostrando a boca banguela. “Sim, era isso mesmo...” Concluiu.

Nesse ponto se estabeleceu certa camaradagem entre nós. Ele saiu detrás do balcão e começou a contar a vida, como só as pessoas simples e solitárias sabem fazer. Era maranhense, trabalhara em tudo nessa vida, até no garimpo de serra pelada. Fora pescador em São Luiz, casara-se duas vezes e quase se casara quatro. Ele então explicou que quando estava para se casar, das outras duas vezes, Deus lhe dera entendimento e ele desistira da empreitada. Com a segunda e última mulher, já tinha vinte e sete anos de casado e dois filhos. Com a primeira, ficara um tempo junto, pouco tempo... Perdera a paciência, principalmente com o sogro, “que era um pinguço de quinta categoria” e a abandonara, juntamente com os três filhos. Tomou uma “ojeriza” tão grande da criatura que nunca mais voltara nem ao menos para ver os meninos. Contou tudo isso sorrindo, sem um pingo de remorso.

Aí então concluiu: “A coisa que eu mais gosto é liberdade”! Se eu fosse mais jovem, tivesse mais saúde, sumia no mundo, ia conhecer tudo... Eu, que sou uma viajante natural, tive meus instintos aguçados. Perguntei: “O Senhor tem vontade de viajar para o estrangeiro”? Não ficaria com medo? Ele afirmou que era isso mesmo. E, concluiu: “melhor coisa que existe é correr mundo".

Fiquei ali pensativa alguns minutos, olhando para os meus tênis novos, sentindo o latejar do pé. É, liberdade é uma coisa boa, um tesouro. Mas, pra ser boa de verdade mesmo, precisa se ajustar perfeitamente ao corpo da gente, ser confortável, assumindo a nossa forma. Algo assim, como um tênis velho.



ELIANE BRITO, é escritora, advogada, conselheira seccional, presidente da Comissão de Cultura da OAB-GO. eliane@rodovalho.com.br


quinta-feira, 23 de setembro de 2010

A FORÇA ESTÁ EM VOCÊ!

Fiquei alguns segundos tentando identificar seus sentimentos (técnica que havia aprendido com a prática do Yôga) e rapidamente deduzi: “Ela deseja morrer, é isso”. Como uma observadora distante, pois, era apenas uma amiga, não entendi. Sua vida parecia perfeita. Tinha uma família, carreira, casa maravilhosa em condomínio de luxo, tudo que uma mulher poderia desejar. Impotente, somente constatei que ela queria morrer.

Essa certeza se cristalizou em meu espírito e comecei a conversar com ela. Ela estava possuída por um monstro, muito comum na sociedade moderna, talvez mais comum do que na antiguidade, chamado “depressão”. Contou-me chorando que passava horas do dia imaginando técnicas sofisticadas de tirar a própria vida. Rechaçara várias e por fim, optara por uma que achara mais simpática. Entupir-se-ia de calmantes, encheria a banheira e tinha certeza, morreria afogada. Segundo ela, o psiquiatra ao lhe receitar os remédios, a alertara que caso viesse a ingerir “acidentalmente” todos os comprimidos da caixa, não morreria, simplesmente dormiria por alguns dias. Explicara-lhe que era um remédio seguro. Porém, dentro de uma banheira, não haveria segurança.

Mas, ali, naquele momento, quem não estava segura era eu. Sempre fui uma referência no que diz respeito a bom-humor e alegria. Entretanto, tinha de admitir, não sabia o que fazer. Como ajudá-la? Afirmei-lhe que essa companheira indesejável que ela adotara: “A tal dona depressão”. Tinha de ser expulsa da sua vida de qualquer maneira. Ela jamais deveria ter aberto a porta de sua casa, de sua vida, para essa dona. Ela me contou que agora era impossível, sempre que acordava essa senhora mal-educada, estava ali, com sua cara soturna lhe observando. “Quando percebi me acompanhava por todos os lugares, ditava minha rotina, controlava meus passos”. Concluiu. Animei-a um pouco e me retirei, com o coração na mão de preocupação.

Dias depois viajei para Aruanã. Ali, a providência divina, Deus, ou seja, lá o que for me colocou frente á frente com “Lars Grael”, o campeão mundial e medalhista olímpico de Iatismo, que perdeu uma perna em um acidente no mar. Perguntei-lhe: “Lars, quando você estava ali caído e depois no hospital, tendo de conviver com um trauma tão grande, onde você encontrou forças? Como conseguiu reconstruir sua vida e se recuperar?” Ele falou sobre várias coisas, sobre Deus, sobre as orações que recebera, pensou e por fim concluiu: Existe uma força dentro de nós, não posso dar um nome específico, talvez seja Deus, mas, todos têm a capacidade de reagir. De seguir adiante.

Voltando a Goiânia, relatei essa conversa a minha amiga e lhe afirmei. Vamos lutar! Vamos procurar essa força! Levante dessa cama e quando essa Dona depressão lhe mandar morrer, sorria e dê de ombros. Ela reagiu, topou o desafio. Voltou a praticar exercícios, começou a se alimentar melhor, reduziu paulatinamente as doses de calmante, voltou a rezar (pois, havia parado totalmente). E assim, a mudança foi se operando. Expulsou a Dona depressão de sua vida, jogou suas tralhas na rua, deu-lhe com a porta na cara e resolveu: “Quero viver”.

A cabala nos ensina que Deus, no primeiro dia, quando criou a terra, viu que o que ele havia feito era “bom”. Talvez, esse seja o sentido da vida: Ela é simplesmente boa. E é por isso que convidei essa dona, “dona vida” para sempre me acompanhar, para me ensinar e orientar no caminho. Ela sempre está comigo e eu a louvo e bendigo. Descobri que minha amiga é forte e que essa força também vive em mim e em você. Shalon.





ELIANE BRITO é escritora, cronista e advogada. eliane@rodovalho.com.br

terça-feira, 17 de agosto de 2010

CONDUZINDO MISS ELIANE.

Que figura ao mesmo tempo doce e enérgica, pensei, observando o simpático velhinho. Perguntei seu nome e ele me respondeu que se chamava “Les Stokes”. Eu rapidamente decidi que o trataria simplesmente por Mister Les. Estava na Inglaterra e fui premiada com a sua companhia , como meu motorista. Ele assumiu essa tarefa e mais ainda, assumiu o papel de meu guardião, intérprete (para meu desgosto, pois queria praticar a lingua) e meu mordomo. Eu diria que Mr. Les adotou-me em solo inglês. Nossa empatia foi instantânea.

Na primeira manhã ele me aguardava empertigado na porta do hotel, na cidade de Cambridge. “Miss Elaine, onde deseja ir?” me perguntou com seu inconfundível sotaque inglês. Falei que gostaria que ele me deixasse no centro histórico da cidade universitária. pois, iria apenas perambular, sem destino certo. Ele então me conduziu até as proximidades do mundialmente famoso “Kings College”, a escola dos filhos da monarquia e da aristocracia britânica. Desembarquei e comecei a caminhar. Logo, adentrei em uma igreja secular, que sem dúvidas era mais velha que o Brasil. Fiz o sinal da cruz e comecei a orar. No fundo da igreja percebi a presença silenciosa e protetora de Mr. Les. Havia me seguido. O seu olhar  era sempre vivo e inteligente, mas, observei que estava triste e pude perceber seus olhos marejados de lágrimas.

Percorri a encantadora cidadezinha universitária, observando tudo. Cambridge foi construída às margens do rio Cam, que junto com sua charmosa ponte dá nome a cidade: Cam+bridge. Aproveitei para visitar o “College” que abrigara Charles Darwin e muitos outros pontos interessantes. Ao final de minha excursão, como toda mulher que se preze, estava carregada de sacolas. Quando cheguei ao local combinado para retornar, Mr. Les, com sua pompa inglesa característica exclamou: “Oh! Pelo jeito foi uma manhã bem feliz para nossas lojas!” Sorri e expliquei que era meu material de trabalho. Livros.

Começamos uma agradável conversa e decidi ensiná-lo algumas palavras de português. Ensinei-lhe: “bom dia, boa tarde, até logo, muito prazer, etc.” Ele anotava tudo e prometeu-me estudar depois. Mas, o que se tornou a marca de nossa amizade foi uma certa palavrinha. Disse-lhe: “Olhe, vou ensinar-lhe uma expressão que serve para tudo em nossa língua, equivale ao OK de vocês, repita comigo: ‘Beleza’. Doutrinei, fazendo sinal de positivo. Ele falou arrastado: “Pelêêzzaaa”... gargalhei e repeti até ele aprender. Todo dia ao encontrá-lo ele me dizia: “Belêzzaa?”. E eu respondia da mesma forma.

No segundo dia, atrasei-me e perdi o café da manhã do hotel. Quando desci, Mr. Les me aguardava, recostado ao veículo. “Aonde vamos professora?”. Respondi: “Estou morta de fome, quero tomar o tradicional breakfast inglês”. Quando adentramos o restaurante, ele tomou a frente e não me deixou falar uma palavra. Explicou para todos os atendentes que eu era brasileira, encantado, com as profundas exclamações de espanto, emitidas pelos interioranos garçons. Sentei-me em frente a uma montanha de ovos, bacon, tomates e torradas. Ele então, pediu permissão para me fazer companhia, ao que eu acedi. Era um dia agradável de verão.

Contou-me, que já havia se casado duas vezes. A primeira esposa havia falecido, logo após dar à luz uma filha, que atualmente residia na Flórida, EUA. Ficara muitos anos viúvo e viera a se casar novamente, mas a segunda esposa veio a falecer duas semanas antes. Levei um susto! Exclamei: “Duas semanas?”. Ele com ar melancólico, respondeu: “Agora estou totalmente só. Trabalho para não enlouquecer!”. Pensei comigo: A força e fragilidade humana não têm fronteiras, somos iguais em toda parte.

Os dias transcorreram, visitei Birmingham, Stratford Upon Avon (a cidade natal do grande poeta Shakespeare) e finalmente chegou o último dia de seus serviços, ou melhor, dizendo, de sua companhia. Quando me deixou à porta do hotel, em Londres, falei brincando, como sempre o tratava: “Lorde Les (título nobre e respeitadíssimo na Inglaterra, concedido somente pela Rainha do Reino Unido), receba esse presentinho como sinal de agradecimento e amizade.” Entreguei-lhe então, uma caixa de bombons belgas, com um cartão onde dizia: “Você não está sozinho! Deus não abandona ninguém. Lembre-se disso... Obrigada!” Ele leu e grossas lágrimas escorreram de suas faces. Também chorei. Como se tivéssemos ensaiado, nos abraçamos e viramos as costas decididos, seguindo nosso caminho. Talvez para nunca mais nos encontrarmos... Beleza?



ELIANE BRITO é escritora, cronista e advogada. eliane@rodovalho.com.br

sexta-feira, 21 de maio de 2010

AUTO-TERRORISMO PSICOLÓGICO

São incomuns os casos de câncer em minha família. Excetuando uma tia, que desenvolveu um câncer de ovário e que agora está totalmente curada, não me recordo de mais nenhum caso. Mesmo assim, quando comecei a sentir uma dor aguda e persistente na mama direita, senti um medo enorme apoderando-se de minha alma. Passei uma noite em claro, pela dor e pelo terror psicológico, alimentados por mim. Não disse nada a ninguém e no dia seguinte pela manhã, segui para o consultório médico. A médica pediu todos os exames de rotina, ultra-sonografia, mamografia e eu insisti que ela pedisse uma ressonância magnética, pois não queria me arriscar. Três dias para fazer os exames, quatro aguardando os resultados. Vivi em suspenso durante uma semana.

Porém, deve ter sido uma das semanas mais profícuas de minha vida. Passei uma tarde inteira dentro de uma livraria, comprando todos os livros que tinha direito sobre o câncer. Descobri em profundidade o mecanismo da doença e como ela se desenvolve. Descobri as dietas recomendadas e fiquei até feliz, pois, uma série de prescrições recomendadas aos pacientes com câncer eu já sigo rotineiramente em minha vida. Por exemplo, uma coisa que me surpreendeu é que a maioria dos médicos recomenda que o paciente pratique uma atividade física, de médio a alto impacto. Isso para mim já é rotineiro. Recomendam que consuma-se pouca ou nenhuma carne, ponto pra mim. Pouco açúcar, ponto pra mim. Muitas verduras e frutas, ponto pra mim. Nada de álcool, ops!

Às vezes ficava até animada olhando as indicações, mas, a dorzinha ali me lembrava de que algo estava errado. Além do que, minha mente se recusava a alimentar pensamentos positivos. Meu cérebro trabalhava numa zona cinzenta, afastando todo e qualquer pensamento cor-de-rosa. Literalmente, eu trabalhava contra mim.

Chegava à noite em casa e começava a faxinar. Arquivei documentos, etiquetei, coloquei datas, organizei fotos, preparando tudo para, caso eu faltasse, deixar organizadinho. Comprei um monte de álbuns de fotografia e organizei uma caixa de fotos, que ficava guardada, etiquetando até por ano e mês cada evento. Como chorei! Nossa! Olhando minha vida desfilando ali, nas fotografias: minhas filhas bebês, batizados, aniversários, viagens, chorei horrores... Como a simples ameaça de adoecer ou até morrer, mexeu com minha cabeça... Discretamente, eu que não cozinhava há alguns anos, comecei a levar minhas filhas para a cozinha e ensinei-lhes a preparar pratos simples, como arroz, bife, macarrão. Vai que elas precisassem cozinhar no futuro?

No dia marcado fui buscar os resultados. Peguei os envelopes e com as mãos tremendo, corri para o estacionamento da clínica, tranquei-me dentro do carro e abri o envelope grandão da ressonância. Sei que isso é errado, mas, não resisti. Li, reli, respirei fundo e não entendi nada. Só a palavra “normal”, saltava da folha branca. Parece que está tudo bem, pensei... Abri os outros, “normal”, “normal”. Fiquei ali, mole, sentindo toda a tensão dos últimos dias esvair-se. Não é possível, e essa dor? Quando mostrei os resultados para a médica ela me perguntou se eu havia praticado alguma atividade física nos últimos dias. Lembrei que havia nadado muito. Ela então concluiu que era um trauma muscular, sem grandes conseqüências.

Saí do consultório radiante! De alguma forma, havia ganho uma nova chance e nesse processo, aprendera a valorizar minha vida, as pessoas que amo, minha saúde, as coisas simples do dia-a-dia. Descobri que quando sentimos uma ameaça à vida, ninguém pensa em bens materiais, posses, etc. Só nos lembramos das pessoas que amamos. Da vida, realmente, só levamos o amor. Grande, imenso e profundo.



ELIANE BRITO, é escritora, cronista e advogada. eliane@rodovalho.com.br

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Evitando contato com Ets.

“Há uma grande possibilidade de existência de vida fora da terra – mas os humanos fariam bem em evitar qualquer contacto com extraterrestres, defende o físico britânico Stephen Hawking.” (Estadão).



O famosíssimo e respeitado astrofísico Stephen Hawking, fez a advertência transcrita acima. Eu acabara de entrar em casa e estava começando a assistir o Jornal Hoje, quando Sandra Annenberg, com cara muito séria, leu o “aviso” do cientista. Juro por Deus! Caí na gargalhada! Achei tão esdrúxula e diferente a notícia que comecei a rir. Depois, como o telejornal prosseguiu normalmente, percebi que a coisa era séria. Tem cabimento? Um cientista da estatura desse homem alertando para esse tipo de coisa? Cogitei duas possibilidades... Ou realmente era algo com o qual devêssemos nos preocupar ou ele estava ficando totalmente esclerosado. Aí, certo pavor me envolveu... Pensei rapidamente: _Tem lógica! Quem foi o maluco que enviou essas sondas e essas mensagens para o espaço? E agora? Tremi de medo.

Não bastasse termos de lidar com o Lula, com o Serra, com a Dilma (uma perfeita marciana...) ainda temos que nos preocupar com uma invasão eminente. Aja stress. Será, Sr. Stephen Hawking, que não poderemos ter um pouco de PAZ nesse planeta? Isso por que nem mencionei os políticos locais. Mas, a grande preocupação do físico é com a possibilidade de virmos a ser explorados, digo nós terráqueos... Ele cita o exemplo de Cristóvão Colombo, quando chegou as Américas. Fala que não passaríamos de colônia de exploração. Ao que me conste, isso não alteraria grande coisa na minha realidade. Quem, em santa consciência, pode levantar a mão e dizer que não é explorado? Eu sou todo o dia. Pelos juros extorsivos dos bancos, pelo sistema tributário abusivo e maluco do nosso país, pelo desrespeito que campeia solto por toda parte. Pelo alto preço de tudo. É só exploração!

Hawking avisa que é bom evitar contato com extraterrestres. Olhe, é bom evitar contato com tanta coisa: Gripe suína, políticos, maçaneta de ônibus, vaso sanitário público... A lista é enorme. Mas, sempre estamos mantendo contato e, o melhor, sobrevivemos. Quem nasce brasileiro Sr. Stephen, é antes de tudo um sobrevivente! Chego até a arriscar, se os ETs qualquer dia desembarcarem na Terra, aonde eles vão se alojar.? Aqui. Aqui nessa terrinha cheia de sol e de gente de couro duro. Couro tratado na inflação, curtido na chibata, curado no sal grosso e disposto a enfrentar tudo... Até ET. O que brasileiro não suporta é ficar sem uma “carninha” na mesa, sem uma boa mistura e tragédia das tragédias, sem uma cerva gelada. O resto pra nós é mole. Vou mandar um recado aí, pra esses europeus branquelas e medrosinhos: Se eles (os Ets) aparecerem, mande-os pra cá! Rapidinho eles estarão aclimatados e totalmente inofensivos. E se brincarem, acabam dentro do caldeirão da feijoada!



ELIANE BRITO

quarta-feira, 31 de março de 2010

Vivendo com borbulhas! “Nas vitórias é merecido, nas derrotas é necessário.” ( Napoleão Bonaparte, sobre o Champagne)

Fomos apresentadas no dia do meu casamento. Ali, naquele momento tive a certeza de que ela me acompanharia por toda a vida. Apaixonei-me instantaneamente e maravilhada admirei sua cor, suas borbulhas, o jeito suave como ela se escorregava pela minha garganta. Calma... Refiro-me ao champagne. Devo, porém, confessar, que tenho uma predileção pela viúva (quem conhece compreende) e sempre que posso  delicio-me com uma taça.

Nosso encontro não se deu de forma tão tardia, afinal, casei-me praticamente adolescente. Entretanto, naquele momento uma certeza cristalizou-se em minha alma: Era amor eterno. Nosso casamento era pra sempre. As relações humanas são inconstantes, muitas vezes findam sem motivo, porém esses pequenos prazeres podem nos acompanhar a vida inteira. Os espumantes em geral são um deles. Diz à história que foi descoberta pelo Abade Don Pérignon, porém, temos relatos de vinhos frisantes e espumantes na Europa desde o séc. XII. O famoso abade (marca hoje de um dos melhores champagne do mundo), simplesmente aprimorou o processo de fabricação. Digamos assim, facilitou o caminho para que ela viesse a ser fabricada em grande escala.

Como toda apaixonada tratei de descobrir tudo sobre o foco de minhas atenções. Estudei, pesquisei e até, visitei vinhedos pelo mundo afora... Nas palavras de Tilar Mazzeo, citando o jovem e devasso poeta L. Byron: “a única coisa que as mulheres podem ser vistas comendo é salada de lagosta e bebendo champagne.” Devemos admitir que seja uma idéia bastante atraente. Assim, no curso de minha vida, aprendi a apreciar esse líquido que nos torna mais belas e resplandecentes.

Essa idéia (de que eu adoro champagne) grudou-se de tal forma na minha personalidade, que fatos curiosos acontecem. Por exemplo, em meu último aniversário só ganhei o precioso líquido. Aqui, cabe um esclarecimento: Gosto sim, desse néctar das uvas, mas também aprecio roupas, jóias, sapatos, perfumes, bombons, etc. Outro fato curioso é que as pessoas pensam que só por que se conhece um pouco sobre vinhos espumantes, entendo tudo de vinhos. Aqui cito meu pai, sempre que o indagam sobre casamento (afinal, ele tem quase 50 anos de casado) ele afirma que não entende nada de casamento... Quando o contestam, ele esclarece: _ Olhe, de casamento entendo pouco, afinal só casei-me uma vez, do que eu entendo bem é de Dona L., minha esposa, essa conheço em profundidade. Assim, aproveitando o gancho explico: Entendo mesmo é de champagne, de vinhos, conheço muito pouco...

Um dos aspectos que acho curioso na indústria do champagne e o fato de ter, mesmo no séc. XVIII, muitas mulheres á frente dos negócios. Muitas viúvas inclusive. Após as guerras napoleônicas, por exemplo, a viúva Clicquot, conseguiu dominar totalmente o mercado Russo, transformando sua marca em um ícone de luxo e ostentação nas cortes do Ksar. Até hoje, os povo russo prefere essa marca, em detrimentos de outras. O fato é que a champagne (e aqui uso o termo no feminino) absolutamente, não é uma bebida feminina. Ocorre que, nós mulheres, amamos aquelas taças em formado “flute” e os homens também, admitam! Quando pilotamos uma dessas taças nos sentimos especiais, doces, românticas, poderosas. O que deve ser o objetivo de todo vinho. Não existe som mais doce na terra do que o espocar de uma garrafa. O estampido já nos deixa alerta, e quando o “Créman” escorre pelo gargalo e se aloja no fundo da taça, com suas diminutas bolhas subindo numa sinfonia perfeita em direção às nossas lindas boquinhas. Ah! É o máximo!!! Para mim, é uma necessidade absolutamente básica. E, é por isso que encerro esse artigo, espocando uma bela garrafa de rótulo laranja, talvez a primeira, talvez não. Voilà!!!

ELIANE BRITO, é escritora, cronista e advogada. eliane@ rodovalho.com.br.

quinta-feira, 11 de março de 2010

ADEUS



Adeus! e para sempre embora,
Que seja para nunca mais:
Sei teu rancor - mas contra ti
Não me rebelarei jamais.

Visses nu meu peito, onde a fronte
Tu descansavas mansamente
E te tomava um calmo sono
Que perderás completamente:

Que cada fundo pensamento
No coração pudesses ver!
Que estava mal deixá-lo assim
Por fim virias a saber.

Louve-te o mundo por teu ato,
Sorria ele ante a ação feia:
Esse louvor deve ofender-te,
Pois funda-se na dor alheia.

Desfigurassem-me defeitos:
Mão não havia menos dura
Que a de quem antes me abraçava
Que me ferisse assim sem cura?

Não te iludas contudo: o amor
Pode afundar-se devagar;
Porém não pode corações
Um golpe súbito apartar.

O teu retém a sua vida,
E o meu, também, bata sangrando;
E a eterna idéia que me aflige
É que nos vermos não tem quando.

Digo palavras de tristeza
Maior que os mortos lastimar;
Hão de as manhãs, pois viveremos,
De um leito viúvo despertar.

E ao achares consolo, quando
A nossa filha balbuciar,
Ensiná-la-ás a dizer "Pai",
Se o meu desvelo vai faltar?

Quando as mãozinhas te apertarem
E ela teu lábio -houver beijado,
Pensa em mim, que te bendirei
Teu amor ter-me-ia abençoado.

Se parecerem os seus traços
Com os de quem podes não mais ver,
Teu coração pulsará suave,
E fiel a mim há de tremer.

Talvez conheças minhas faltas,
Minha loucura ninguém sabe;
Minha esperança, aonde tu vás,
Murcha, mas vai, que ela em ti cabe.

Abalou-se o que sinto; o orgulho,
Que o mundo não pôde curvar,
Curvou-se a ti: se a abandonaste,
Minha alma vejo-a a me deixar.

Tudo acabou - é vão falar -,
Mais vão ainda o que eu disser;
Mas forçam rumo os pensamentos
Que não podemos empecer.

Adeus! assim de ti afastado,
Cada laço estreito a perder,
O coração só e murcho e seco,
Mais que isto mal posso morrer.

Lord Byron
"Poema que Byron escreveu qdo a esposa pediu o divórcio"

quinta-feira, 4 de março de 2010

VIDA DE VIAJANTE.


Finalmente entendi. Quando viajo, o que realmente me atrai não é a paisagem diferente, as pessoas, as comidas, nada... O que me atrai de verdade é a possibilidade de ficar sozinha comigo mesma, rever minha vida, entender alguns pontos. Fico imaginando, como era, quando as pessoas perdiam meses viajando de navio ou carruagem, para chegarem a algum destino. Devia ser maravilhoso, ficar dias sem fim, meditando (essa é a palavra), pensando, enquanto se olhava para o espaço. Nesse mundo atribulado em que vivemos, sentimos necessidade de alguns momentos de introspecção. E, pelo menos para mim, uma viagem_ durante o percurso_ me proporciona essa higiene mental. Depois, desse mergulho intenso e profundo dentro de mim, sempre volto diferente. Finalmente entendo coisas que me negava a ver. Finalmente, descarto sensações que já estão até gastas de tão ultrapassadas. Foi assim, na minha última viagem.
Sobrevoava a Bolívia. Sempre peço um assento junto à janela, para poder observar alguma coisa da paisagem, ou simplesmente, olhar as nuvens que flutuam no céu. Mas, nesse dia o tempo estava aberto, céu azul, sem nenhuma nuvem, mesmo a grande altitude. As montanhas nuas abaixo, sem nenhuma vegetação, alternavam os tons de marrom e vermelho intenso. Pequenos povoados quebravam a monotonia da paisagem. Fiquei horas pensando na vida e esperando divisar o Lago Titicaca e finalmente, quando achei que distinguia no horizonte uma massa de água, percebi que era o oceano. Provavelmente não sobrevoaria o maior lago do mundo. O avião havia cruzado toda a América Latina em linha reta, até atingir a região do pacífico, na altura da cidade de “Pisco”. Retornou sobre as praias de águas espumantes em direção à Lima, no Peru. Porém, essas horas que pude desfrutar, enquanto simplesmente olhava pela janela são impagáveis. Comparo minhas profundas reflexões com uma experiência de “quase-morte”. Simplesmente, desloco-me de minha vida, afasto-me e observo o mundo material. Em que eu vivo. Olho de uma forma superior, aquela vida que deixei em meu país e assim, diviso melhor os detalhes que passam despercebidos. Experiências que teimo em ignorar e é claro, tomo algumas resoluções.
Minhas viagens acabam se dividindo em três etapas: Na primeira, visualizo minha vida, meus problemas, balizo coisas que são importantes, faço uma espécie de catálogo mental. Na segunda etapa (que vejo como uma etapa ascendente) misturo tudo isso com as experiências que estou vivendo, tenho insights, testo e aprovo fórmulas, confronto com os costumes e as realidades que estou observando. Na terceira etapa, já descendente, inevitavelmente tomo resoluções. E geralmente as sigo. Pois, talvez por serem frutos de um processo tão rico, marcam-me profundamente e se cristalizam dentro de mim. Tornando-se parte da minha futura vida, ou seja, do meu retorno para casa. Nessa última etapa, já sinto certa ansiedade e uma vontade de retornar para minha existência. É a expectativa do que pretendo realizar, é a vontade de transformar um pouquinho meu mundo.
E assim, fecho um circuito de auto-conhecimento que só uma viagem pode proporcionar. Muitas pessoas conseguem fazer isso sem sair de casa. Meditando, refletindo, rodeados por objetos familiares. Rotinas usuais, sem grandes alterações. Para mim isso não funciona. Preciso viajar. Sair fora do conhecido. Da famosa “zona de conforto” e observar que a vida acontece fora de casa. A vida está sempre presente em todos os lugares. Mutável, inconstante e criativa. E esse sentimento me acalma. O Sentimento de que nada é permanente e que mesmo que eu morra esse milagre estará se processando em algum lugar do globo. Não existe melhor guia para nossas ações de que o sentimento da morte. O Sentimento de que somos uma pequena parcela da criação. Isso nos nivela e destrói todo egoísmo. Esses tesouros são os mais caros que trago das viagens. Inestimáveis.

ELIANE BRITO é cronista, escritora e Advogada. eliane@rodovalho.com.br

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

SALDO DE CARNAVAL

Sabemos que tudo que nos acontece deixa marcas. E, a maior festa do país, o carnaval, não é diferente. O carnaval, como todas as grandes festas, deixa no seu rastro os sinais da folia e da confusão. Mas, enquanto uma festa comum deixa copos quebrados, balões espalhados pelo chão, sujeira e restos de comida, o saldo do carnaval muitas vezes é: acidentes, famílias destruídas, crianças indesejadas, Aids, bebedeiras e por aí vai...
Essa festa popular tão linda e tão rica nasceu na idade média na Europa e se disseminou por Portugal com o nome de “intrudo”. Realmente, ela tinha um caráter de “liberdade” e “exagero” desde o seu berço, porém, nos dias de hoje, onde tudo assume uma dimensão maior, ela se potencializou em milhares de vezes. Teoricamente o carnaval seria uma despedida antes do período sacrificial da quaresma. Mas, hoje em dia? Onde as pessoas, naturalmente, já não respeitam nada (nem religiões, nem sacrifícios), qual o verdadeiro significado dessa festa popular? Ninguém saberia dizer... E, os resultados dessa loucura coletiva, dessa catarse comum, se vêem ostentado nas páginas dos jornais. Esse foi - segundo dados da Polícia Rodoviária Federal - o carnaval mais mortífero dos últimos tempos, com milhares de pessoas aleijadas ou mortas como saldo final. É um preço caro que se paga por tanta alegria. É o preço de vidas humanas.
Posso colocar a imaginação para funcionar e idealizar todos os efeitos carnavalescos repercutindo pelos próximos meses. Realmente é uma festa que movimenta o país, pois, podemos prever que se venderão mais remédios nos próximos dias, o que é ótimo para a indústria farmacêutica. Remédios para DSTs variadas, antidepressivos, pois a ressaca moral carnavalesca pode ser bem cruel; estimulantes, para ajudar os cansados foliões a retornarem ao trabalho; vitaminas para (aqueles que ficaram até anêmicos) por se esquecerem de se alimentar. Para os bancos - que são quem realmente ganham dinheiro nesse país- é uma grande festa! Têm gente que vai precisar de uns dois anos para conseguir quitar as dívidas da farra. É juro de cheque especial, cartão de crédito, empréstimos.
Muitos profissionais liberais também ganharão dinheiro pelos próximos meses e desses destaco duas categorias: Advogados e Psicólogos, atuando juntos ou separadamente, sei lá! Sabemos que a maior parte dos problemas relatados acima, redunda em ações, que muitas vezes necessitam da atuação de um desses profissionais. Para os advogados, são indenizações, reconhecimento de paternidade, acidentes de trânsito, divórcios, ações contra bancos, etc. Quanto aos psicólogos, fornecem o suporte da “análise”, para levar o folião a entender o que o motivou (verdadeiramente) para cometer aquelas loucuras todas e assim, se conhecer melhor.
O único saldo positivo desse carnaval, na minha concepção, é que os jovens saíram um pouco da frente da televisão. Pelo menos por alguns dias se libertaram do Big Brother, como todos sabem, programa grotesco atualmente no ar, em nosso país. Carnaval x BBB. Acho que dá um empate no final. São choques titânicos do esdrúxulo, do bestial, temperados por uma boa dose de sexo, muitas vezes explícito.
E a alegria? Vamos nos concentrar na alegria... Perdoem-me o cinismo: Primeiro ponto positivo: Acabou. Graças a Deus! Segundo: Sobrevivemos! Isso é bom. Terceiro: Para alegria geral, ano que vem tem mais! E, a roda da vida segue girando...

ELIANE BRITO, é escritora, cronista e advogada. eliane@rodovalho.com.br

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

CIDADELA DE MACHU PICHU


Céus, como pode existir tanta beleza? De um ponto privilegiado observava a montanha de Machu Pichu, que quer dizer “montanha velha” e lutava para respirar. A Altitude não ajudava e também a longa escadaria que havia subido para chegar até ali. Mas, olhando a paisagem não me arrependi, valera a pena! A impressionante cidadela se desdobrava aos meus pés, encravada na velha montanha, que se abria e estendia-se na paisagem, criando uma espécie de vale suspenso onde as construções se apoiavam. Alguns já a chamaram de “cidade perdida dos Incas”, mas, os andinos que eu conversara, me afirmaram que a verdadeira cidade ainda não foi descoberta. Está escondida em algum lugar da Amazônia, talvez até no lado brasileiro. Dizem que ela é feita toda em ouro e em pedras preciosas. Para os Incas o ouro são as lágrimas do Sol e a prata, o choro da lua.
Essa cidadezinha, construída caprichosamente por esse povo, é considerada um santuário histórico. Uma das sete maravilhas do mundo. E ali, observando o verdor das montanhas, com moitas ocasionais de flores em diferentes matizes, com nuvens passando tão rápidas sobre minha cabeça - que quase se poderia tocar - senti em todo meu corpo como aquele local era especial. O título de cidadela se justifica, pois, a mesma é guardada por quatro montanhas, a que a abriga e as outras três, garantindo a privacidade e a segurança. Ofegante, retirei algumas folhas de coca do bolso e comecei a mascar, tal quais os cusquenhos, enquanto sentava-me e observava a paisagem, jogando o ar frio nos pulmões.
Quando chegara a Cuzco, no vale de huatanay, ou vale sagrado, em uma manhã fria de janeiro, já me deslumbrara no avião com a paisagem Andina. As majestosas montanhas se projetavam para o céu, como se quisessem ferir as nuvens. Algumas de forma caprichosa e requintada, ostentavam em seus cumes uma cobertura de neve. Volta e meio um lago verde e profundo quebrava a simetria da paisagem. O chá de coca era um santo remédio nessa altitude (estava a mais de três mil e quatrocentos metros de altura). Descobrira isso de imediato. Quando pisara em solo a pressão atmosférica repercutira como um leve zunido nos ouvidos. A Cabeça começou a latejar, um estranho aperto comprimia o peito, estava ofegante. E a sabedoria milenar já ensinava, nenhum remédio seria capaz de aliviar esses sintomas. Somente a “hoja de coca”. Que não é droga e tem um efeito infinitamente mais suave que a cocaína, essa última, seria como o extrato da folha potencializado em milhares de vezes. Foi um bálsamo quando o atendente do hotel, antes mesmo de me cumprimentar, me ofereceu uma xícara bojuda do precioso líquido. Tomei sofregamente, na tentativa de amenizar os sintomas. Tinha gosto de mato, mais nada. Após alguns minutos meu corpo começou a se estabilizar. Os nativos sabiam que esses males poderiam se agravar e se transformar no “Sorochi”, ou mal das alturas. E, por isso eram firmes na orientação de que tomássemos a bebida.
Deixando de lado essas digressões, concentrei-me em observar as edificações. Minha atenção foi atraída por uma grande pedra que se destacava, centralizada em um pátio. Tratava-se de um observatório astronômico. Ali, os sacerdotes incas, observavam o céu e anotavam com precisão todos os eventos celestes, desde os eclipses (o mais temido), até os cometas, órbitas de planetas, etc. O objetivo da pedra era muito simples. Quando havia algum eclipse, eles por medo de que o sol não retornasse, sacrificavam a mais preciosa oferenda, “uma virgem do sol”, moças preparadas à vida inteira para esse momento, com educação e alimentação diferenciadas. E o interessante é que essa pedra ficava postada exatamente de frente para o nascimento do astro. Quando ele emergia entre as montanhas, incidia diretamente ali. O sol recebia o nome de “inti” em Quéchua, o idioma incaico e era o Deus mais importante.
Fiquei ali, um pouco aturdida, sentindo o Deus em minhas faces e agradecendo por aquele momento único. Meu coração parecia um tambor no peito, batendo forte em admiração e respeito por aquele povo. Que, vivia em integração com a natureza, com engenhosidade e sabedoria, que agradecia pelo alimento, pela grande dádiva viver nesse planeta. Que, sabia que não existimos separados da natureza. Que a vida se processa de forma integrada e que nós somos apenas uma parcela da criação. Ali, naquele momento, pensei que realmente acredito que ainda não se encontrou a verdadeira cidade perdida. A verdadeira Machu Pichu. Simplesmente, por que ela está dentro de nós. Para se chegar até ela o passaporte é o amor e a pureza de alma. Por isso ela se perde nas brumas e a humanidade caminha em escuridão, decaída, sem saber que direção seguir. Sem saber como alcançar pensamentos puros como a luz, que nos encaminhem para essa cidade de ouro.

ELIANE BRITO é escritora, advogada. eliane@rodovalho.com Publicado no Dm do dia 01/01/2010