terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Merde!


Essa semana fui confrontada com uma pergunta. Até que ponto é saudável xingar? Estou falando de xingamentos assim, que são um verdadeiro desabafo...Tipo, droga, m..., aqueles que nos saem espontaneamente quando algo de ruim nos acontece... Andando pela casa esbarrei em uma mesinha lateral, não contive a exclamação! (vou dizer em francês, por que fica mais chique). Merde! Imediatamente fiquei sem-graça, imaginando que alguém pudesse ter ouvido... mas, essa vergonha me levou a pergunta acima. Será que é realmente nocivo extravasar nossos sentimentos negativos... Até que ponto é salutar guardar as emoções mais baixas, como raiva, indignação, dor em nosso íntimo? Será que alguns xingamentozinhos inofensivos não podem ser benéficos pra saúde?
Já que estava me dedicando a esse assunto resolvi olhar no bom e velho Aurélio. Xingar_ verbo transitivo e intransitivo. Opa, já era uma coisa boa, mostrava que ele é maleável, fluído, transita em muitas situações. Entre o bem e o mal, quem sabe... Dentre outros significados o que vejo? “igual a descompor”. Nossa! Descompor quem? Os outros ou a nós mesmos? Nos reconstruir, através da expressão das nossa emoções e quem sabe nos tornarmos pessoas melhores e mais autênticas.
Exclui mentalmente esses pensamentos . Não! Xingar é sempre feio e pessoas irritadas não têm preparo psicológico. Além do que, denota falta de educação. Olhe bem leitores, não estou falando dos grandes xingamentos, estou falando daquela palavra impensada, sabe aquela? Que sai assim, sem nenhuma preparação. Naturalmente. Acredito que o ideal realmente é se manter firme ser radicalmente contra toda forma de linguagem iníqua.(adoro essa palavra, tirei da Bíblia...não parece um xingamento?) A dúvida me corroeu... Adianta, falar pros nosso filhos: “Xingar é feio!” e de repente, bum. Esbarra na mesinha e...saiu!
Imediatamente comecei a rememorar as grandes xingadoras que eu havia conhecido durante a vida e estarrecida constatei que todas estavam bem e saudáveis. A mais notória, avó de um grande amigo, havia completado 80 anos recentemente, festa grande, família toda reunida, saúde de ferro. Notabilizou-se por nunca “ter levado um desaforo pra casa”. As pessoas comentavam com orgulho suas peripécias, rememoravam brigas memoráveis: no trânsito, com o jardineiro, na feira, com taxistas, familiares. Ninguém escapava de suas investidas certeiras... Caso se sentisse injustiçada, não ponderava um segundo. Tirava satisfações na hora. E não hesitava em extravasar xingamentos tipo: Crápula! Cachorro! Constava do seu repertório, uma palavrinha que eu acho o máximo na língua portuguesa, pois nos remete as nossas raízes católicas, nossa herança ancestral. “Excomungado”. Lembro que quando era criança achei tão legal essa palavra que pesquisei no dicionário. Pois, na prática essa palavra não existe. Pelo menos eu não conheço nenhum excomungado. É uma palavra forte! Salta da boca como uma pequena explosão. Deve ser dita de uma vez só. Em um só sopro e de preferência gritada pra surtir efeito! Não pude deixar de pensar, que, de alguma forma, devemos evitar guardar e remoer o que nos prejudica. Lembrei-me de quando tive um acidente terrível de carro e algumas pessoas me perguntavam o que eu havia sentido na hora, quando percebi que iria bater de frente no caminhão. Ficava calada e não respondia nada. Pois, a verdade quero confessar agora. Quanto mais me aproximava do caminhão, repetia mentalmente uma única palavra: “Fud**! Fud**! Fud**! Pode uma coisa dessas? Se eu tivesse morrido, esses teriam sido meus últimos pensamentos. Mas, acho que o cérebro, desencadeia em situações de tensão, palavras fortes, que expressem essas emoções e trabalhem o choque. E o que acontece quando você sai do outro lado? Depois desses desabafos. Você sai leve! De alguma forma colocou a energia negativa pra fora.
Finalmente defendo ainda, a teoria de que tal comportamento é inato ao ser humano. Digo isso por observação própria. Já vi crianças repetirem essas atitudes, quando caem ou se machucam de forma automática. Penso que o esquema é o seguinte. Se você foi agredido de alguma forma, seja verbalmente ou um acidente, ou coisa qualquer. Abre-se um mecanismo de auto-proteção imediata. O Cérebro manda rapidamente a resposta que vai equilibrar a situação. E o que nós devemos fazer? Aceitar. Pois, tudo que ataca nossa natureza animal e primitiva, gera doenças. Já, segundo os ensinamentos hinduístas devemos alcançar um estado de distanciamento dos acontecimentos materiais, que nos levem a ignorar todas as situações adversas. Nosso mundo é uma ilusão, não existe. Só o nosso mundo mental de paz é real, plácido como um lago. Mas, acreditem em mim, pratico meditação há alguns anos. É difícil. Quando a realidade nos pega desprevenidos. Colocamos tudo a perder.
Para confirmar minha teoria, lembrei de todas as pessoas altamente controladas que havia conhecido. Sabe aquelas que nunca xingaram, perfeitas! Bom, é a minha experiência... nenhuma está viva.
Merde! Merde! Merde! Queimei a língua com o chá...

Eliane Brito

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